Pesquisadores da química desenvolveram material que cria uma nova possibilidade para tratar os resíduos da indústria. A tecnologia rendeu, como um dos seus frutos, um depósito de pedido de patente, em outubro, junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), cujo nome foi Compósitos bioadsorventes de quitosana, bentonita e biocarvão para o tratamento avançado de efluentes via adsorção e adsorção/flotação, seu processo de obtenção e uso.
A invenção é um material sólido que, misturado aos resíduos aquosos da produção de uma fábrica, reduz a concentração de contaminantes orgânicos e inorgânicos. O tratamento desses efluentes permite que haja o reaproveitamento para uso em situações domésticas, como lavagens, bem como que seu descarte seja feito de acordo com a Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente. Joemil Oliveira de Deus Júnior, autor da dissertação que deu origem ao pedido de patenteamento, acrescenta que a sustentabilidade é um dos pilares da nova tecnologia, além de pontuar que a facilidade do produto patenteado, em relação a outros materiais, está relacionada com o método de produção, no qual o material é sintetizado a partir do gotejamento em solução alcalina.
“O dispositivo é um compósito bioadsorvente, produzido a partir de quitosana, bentonita e biocarvão da munguba, a Pachira aquatica aubl, ou seja, em parte com resíduos. Esse compósito é destinado para o tratamento avançado de efluentes aquosos, como os da indústria petrolífera, que contém metais e apresentam caráter tóxico e cancerígeno. A adsorção é um método de tratamento de baixo custo, fácil instalação e operação, porém o uso do carvão ativado como adsorvente acarreta custos elevados para a operação. Uma alternativa economicamente viável é o uso de materiais naturais com baixo valor agregado, os bioadsorventes. Dessa forma, o que fizemos foi valorizar o resíduo proveniente da casca do fruto da munguba, através da sua aplicação como potencial bioadsorvente para o tratamento da água produzida, avaliando a remoção de metais pesados, como cobre, chumbo e cromo pelo método de adsorção em banho finito”, explica Joemil Júnior.
Ao atuar no tratamento dos efluentes industriais antes do seu descarte, evitando a contaminação aquática e a destruição de ecossistemas, a nova tecnologia entrelaça-se a um tema pertinente na atualidade: a preservação dos recursos hídricos. Afinal, alguns segmentos, como as indústrias petrolífera, têxtil e alimentícia, possuem grande potencial de poluição através do descarte de resíduos, pois tais “detritos” contém contaminantes específicos que requerem técnicas avançadas de remoção. “Por isso, a busca pelo desenvolvimento de tecnologias alternativas sustentáveis e de baixo custo para serem aplicadas no tratamento desses efluentes é essencial tanto para fins científicos quanto comerciais”, destaca o hoje doutorando no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química da UFRN.
Uma das cientistas autoras da invenção, Karine Fonseca Soares de Oliveira comenta que esse contexto toca no conceito de economia circular, uma vez que o compósito é produzido a partir da utilização de dois materiais que podem ser obtidos de resíduos agroindustriais: a quitosana e o biocarvão. “No Laboratório de tecnologia ambiental, temos uma linha de pesquisa destinada ao tratamento de efluentes, onde fazemos o teste de novos materiais para remoção de contaminantes avançados de resíduos industriais, em especial a água produzida. O método de síntese empregado na invenção já está sendo testado com outras matérias-primas e sendo modificado para remoção de poluentes mais específicos e complexos”, ressalta.
Em vídeo, ambos explicam alguns outros aspectos e mostram o protótipo da tecnologia.
O LabTam, ao qual ela se refere, é um laboratório localizado dentro das dependências do Núcleo de Processamento Primário e Reuso de Águas Produzidas e Resíduos (Nuprar). Com mais de 20 depósitos de patente, o grupo de pesquisadores que atua na unidade é responsável por um vasto portfólio de pedidos e concessões de patentes, por vezes, fruto, inclusive, de parcerias com outros laboratórios, como o Laboratório de Peneiras Moleculares e o Laboratório de Tecnologias Energéticas.
Dulce Maria de Araújo Melo, coordenadora do LabTam, defende que o processo de patenteamento é importante, haja vista que é uma oportunidade de, no relatório, descrever o processo de obtenção detalhado da invenção, além de ser um indicador importante no que diz respeito ao desenvolvimento de tecnologias nas instituições acadêmicas. No caso deste último depósito, além de Dulce, Karine e Joemil, participaram da descoberta científica Francisca Iara Araujo Franco, Maria Antônia Cavalcante de Oliveira, Marcus Antonio de Freitas Melo, Renata Martins Braga e Ângelo Anderson Silva de Oliveira.
A descoberta científica passa, agora, a integrar a vitrine tecnológica da UFRN, grupo de invenções formado por mais de 600 ativos de propriedade industrial, entre patenteamentos e registros de programas de computador. A Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) prevê que um invento será protegido por patente se atender aos requisitos de novidade, de atividade inventiva e de aplicação industrial. Em contrapartida ao depósito e à consequente concessão, o inventor se obriga a revelar detalhadamente todo o conteúdo técnico da matéria protegida pela patente, o que contribuirá para o desenvolvimento tecnológico mundial, tornando a patente um importante instrumento na divulgação de informação tecnológica, estimulando novos desenvolvimentos científicos.
Podem ser patenteados processos, produtos ou ambos. A patente refere-se a uma única invenção ou a um grupo de invenções inter-relacionadas, mas que apresentem um só conceito inventivo. Para os pesquisadores que têm interesse em proteger os frutos de um estudo, o primeiro passo é realizar, via Sigaa, a notificação de invenção na aba pesquisa.
Imagens: Cícero Oliveira
Fonte: Agecom/UFRN