A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) recebeu o patenteamento definitivo de um dispositivo que consegue a liberação direcionada de fármacos em diferentes regiões do trato gastrointestinal. A funcionalidade é alcançada por meio de partículas carreadoras em escala nanométrica e micrométrica capazes de incorporar moléculas terapêuticas de natureza tanto hidrofílicas como hidrofóbicas, ou seja, independente de sua afinidade ou aversão a água. Waldenice de Alencar Morais, docente do Departamento de Farmácia e professora orientadora da pesquisa que deu origem ao depósito em 2015, explica que a nova tecnologia pode ser aplicada à indústria farmacêutica de uso humano ou veterinário, química e de alimentos.
“A invenção refere-se ao método de preparo e produto de sistemas nanoparticulados e microparticulados de quitosana, para liberação modificada de substâncias, as quais podem incluir fármacos, peptídeos, proteínas, DNA/RNA, inseticidas, entre outros. Isso foi possível a partir de sistemas particulados à base de quitosana, sulfato e genipina, sendo biocompatíveis e caracterizados com uma carga de superfície positiva. Assim, apresentam uma maior estabilidade para resistir a condições ácidas de pH, extremamente útil para administração oral de agentes terapêuticos”, detalha.
A carta-patente recebeu o nome: método de preparação e produto de co-reticulação de sistemas particulados de quitosana com sulfato de sódio e genipina aplicada à incorporação de moléculas terapêuticas para fins de liberação modificada, e sua elaboração contou com a participação também de Arnóbio Antônio da Silva Júnior e Gabriela Diniz Fonseca. A pesquisa que deu origem à invenção foi realizada no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas.
Arnóbio Júnior, docente do Departamento de Farmácia, explica que são atrativos do processo tecnológico criado a simplicidade e a versatilidade. Ele pontua que o método de co-reticulação ocorre efetivamente em uma única etapa simultânea e nas mesmas condições de pH ácido não antes possível. “A situação influencia na solubilização da matriz polimérica quitosana, bem como, para a administração e compatibilidade de moléculas terapêuticas nessa faixa de pH. Ademais, esse processo permite obter um sistema particulado em escala nano, ou seja, em tamanhos muito reduzidos, mas não só. Alcançamos isso com um padrão de reticulação polimérico mais uniforme de reticulação iônica e química”, ressalta o pesquisador. Além disso, os sistemas obtidos aplicam-se para moléculas que necessitem ter resistência ao pH ácido, como é caso existente no estômago, e serem liberados de maneira prolongada ou controlada visto o uso de reticulação física e química.
Waldenice acrescenta que o grupo de cientistas conseguiu chegar até esse ponto com o emprego de materiais biocompatíveis de origem natural e de baixa toxicidade, como a quitosana e a genipina (reticulante químico), e o sulfato sódio exercendo função de “substância ligante e precipitante”. A junção dos processos em um mesmo sistema possibilita a característica de liberação modificada dos agentes terapêuticos incorporados. “Desse modo, a liberação torna-se controlada, mantendo a concentração do fármaco constante na faixa terapêutica por um período prolongado, utilizando-se de uma única dosagem. Dessa forma, com o intuito de melhorar tais aspectos, a obtenção de sistemas particulados na escala nano ou micrométrica é largamente utilizada como meio de proteção e controle da liberação”, circunstancia a pesquisadora.
Sobre as pesquisas atuais, destacam experimentos ligados à linha de pesquisa em produtos farmacêuticos, a partir de sistemas em escala micro ou nanométrica a base de produtos naturais, como quitosana, papaína e lecitinas, empregando a nanotecnologia farmacêutica com um impacto social. São exemplos os hidrogéis de quitosana e papaína para tratamento de feridas e nanoemulsões à base de lecitinas para desenvolvimento de larvicidas ou repelentes de origem natural para o combate ao Aedes aegypti, também objetos de pedido de patente.
Patenteamento
O patenteamento de uma nova tecnologia é analisado e concedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), autarquia federal vinculada ao Ministério da Economia e responsável pelo aperfeiçoamento, disseminação e gestão do sistema brasileiro de concessão e garantia de direitos de propriedade intelectual para a indústria. Segundo o Inpi, receber a carta-patente de um produto significa ter o direito de impedir terceiros de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar, sem o seu consentimento, o produto objeto de patente ou processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado.
“Para nós, o processo permite que o investimento realizado pelo Estado Brasileiro e pelas universidades, sobretudo na formação de Recursos humanos especializados, agregue também tecnologias de propriedade nacional ao mercado. Isso evita, por exemplo, que nós brasileiros tenhamos que pagar um preço mais alto por tecnologias que foram desenvolvidas por pesquisadores brasileiros. Além disso, fomenta todo um ecossistema de geração de protótipos, de novas empresas de base científica e tecnológica, as chamadas ‘startups’. Nessa perspectiva, os nossos pesquisadores certamente estarão mais capacitados para difundir essas tecnologias e melhor interagir com o setor produtivo, munidos de um capital intelectual de alto valor agregado e potencial econômico, como as patentes”, defende Arnóbio.
No âmbito da UFRN, os pesquisadores que queiram patentear uma invenção devem inicialmente realizar a notificação de invenção, por meio do Sigaa, na aba Pesquisa. Em seguida, recebem orientações da equipe da Agência de Inovação (Agir), bem como o suporte administrativo para as etapas subsequentes, como pagamentos. A Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) prevê que um invento será protegido por patente se atender aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. Em contrapartida ao depósito e consequente concessão, o inventor se obriga a revelar detalhadamente todo o conteúdo técnico da matéria protegida pela patente, o que contribuirá para o desenvolvimento tecnológico mundial, tornando a patente um importante instrumento na divulgação de informação tecnológica e estimulando novos desenvolvimentos científicos.
Fonte: Agecom/UFRN