Mar, sol e dunas, que por muito tempo foram os principais atrativos para o turismo no Rio Grande do Norte, podem não ser suficientes para garantir uma recuperação do setor hoteleiro no momento pós-pandemia. A cadeia, composta por 52 setores da economia interligados no Estado, foi uma das mais afetadas pela crise da covid-19, e deve ser uma das últimas a se recuperar plenamente.
Pesquisa realizada pela Empresa Potiguar de Promoção Turística, a Emprotur, aponta que 84% das empresas tiveram uma queda superior a 75% no faturamento, das quais 79% correspondem a Microempreendedores Individuais. Do total, 42% (189 dos 450 pesquisados) dos que atuam na área do turismo acreditam que não serão capazes de sobreviver se o isolamento social perdurar por mais tempo, e 30% (135) estimam suportar apenas mais 30 dias. Dos hotéis, 57% tiveram registro de cancelamento em 100% das reservas, e 77% de pelo menos 75%.
Segundo o diretor do hotel Ocean Palace, o primeiro a anunciar a suspensão das atividades durante a pandemia em Natal, Ruy Gaspar, cerca de 20 mil empregos já foram perdidos no setor, e os autônomos são os mais afetados. Estimativa, segundo ele, é do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do RN. Dentre os bares e restaurantes do Estado, que somam cerca de 5 mil, de acordo com a sede local da Associação de Brasileira Bares e Restaurantes, cerca de 2 mil estão em risco de fechar às portas definitivamente, a maior parte deles (cerca de 800) na capital potiguar.
Ruy Gaspar afirma que o cenário é de pessimismo diante da falta de previsão para a reabertura. “Fomos os primeiros a fechar, e havíamos anunciado a reabertura para setembro. Agora, não tenho mais nenhuma perspectiva de abrir de fato em setembro. Estou totalmente pessimista. Se continuar como está, o setor pode não se recuperar”, afirma o diretor, que já ocupou a Secretaria de Turismo do Rio Grande do Norte. “As pessoas que foram demitidas em abril e maio ainda têm o dinheiro da rescisão, mas esse dinheiro está acabando. Veja o caso dos bugueiros, que são autônomos. Como essas pessoas estão vivendo?”, diz Ruy Gaspar.
Artur Fontes, presidente da seção local da Abrasel, afirma que “a maior parte dos restaurantes está gastando e esgotando seus capitais de giro e suas reservas para conseguir garantir o pagamento da folha. Eles tentaram se adequar, mas a situação é muito difícil. Junho com certeza será o pior mês dentre todos até o momento, porque às reservas e garantias começam a acabar, e os créditos não estão chegando na ponta de fato”, afirma. A Abrasel estima que, em três meses de pandemia, o setor de alimentação fechou 3 mil empregos em aproximadamente 400 bares e restaurantes de Natal – 20% dos 2 mil estabelecimentos.
De acordo com um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a expectativa é de que o segmento só consiga recuperar sua capacidade ociosa em, no mínimo, 12 meses – para o turismo doméstico. Para o internacional, no entanto, o tempo estimado é de 24 meses. Estima-se que, no Estado, desde o dia 13 de março, 1,4 mil demissões já foram formalizadas e mais de 2 mil contratos foram suspensos, e 30% das vagas formais perdidas durante a crise podem não ser recuperadas de forma definitiva ainda em 2020.
A Emprotur aponta que o setor tem influência de mais de 50% da arrecadação de 12% dos municípios potiguares. Nesse contexto, duas regiões se destacam no Estado: a Costa das Dunas, na qual 56% dos municípios afirmam que o turismo representa até 10% de sua arrecadação, e a região Serrana do Estado, onde 50% afirma que a participação do setor também significa até 10% da arrecadação local.
Setor aposta em capacitação para novos protocolos de higiene
Apesar dos desafios, o turismo no Rio Grande do Norte possui condições propícias para aquilo que deve se tornar mais popular no segmento após a crise: biodiversidade e atrativos naturais com um clima favorável à prática de atividades ao ar livre, uma das apostas do setor, mas que vão demandar uma qualificação daqueles que atuam na área para as novas regras sanitárias.
Passar aos turistas uma sensação de segurança, tanto no atendimento em saúde que podem necessitar como nas barreiras sanitárias, e focar nos potenciais turistas de estados vizinhos, como Paraíba e Ceará, também são algumas das saídas pensadas pelos empresários para os primeiros estágios de recuperação, como explica o presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Rio Grande do Norte, Habib Chalita.
“O principal foco no primeiro momento deve ser o turismo regional, que compreende nossos vizinhos, como o Ceará, Pernambuco e a Paraíba, lugares dos quais as pessoas possam vir de carro, porque muitas ainda não se sentem seguras em entrar em um avião e um ônibus”, explica Chalita.
Para fazer com que os turistas se sintam seguros e amparados, os empresários e microempreendedores apostam em capacitações para os trabalhadores estejam a par dos novos protocolos de higiene. “O turista vai ter que se sentir amparado e seguro quando chegar aqui, desde o momento que chegar ao aeroporto, com a medição de temperatura. Se ele apresenta algum quadro de febre ou contaminação, por exemplo, temos que passar a ele a segurança de onde e vai ficar e ser atendido. Tudo isso é fundamental para que o turista diga: eu vou ao Rio Grande do Norte, porque sei que lá vou me sentir seguro”, diz Habib Chalita.
Para isso, ele afirma que aposta em parcerias entre o setor produtivo e o setor público, principalmente através do diálogo e da troca de informações que vão permitir montar uma rede de assistência conjunta.
Tudo isso, no entanto, ainda está inserido em um contexto futuro. Para que as empresas sobrevivam até lá, os empresários cobram algumas medidas imediatas, como a desburocratização para acesso à linhas de crédito, redução do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para energia e a redução do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), medidas que vão demandar articulações em nível Estadual, Municipal e Federal, como explica o presidente local da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), José Odécio Rodrigues.
“As linhas de crédito foram todas lançadas pelo Governo Federal, e o trabalho agora é para fazer essas linhas de crédito chegarem à ponta. Não é fácil, porque as estruturas burocráticas e os vícios bancários são muito grandes”, afirma José Odécio. De acordo com a pesquisa da Emprotur, 46% dos entrevistados acredita que a renegociação de dívidas será a principal medida de mitigação durante o período. Outros 43% também apontam a necessidade de financiamentos e empréstimos para conseguir sobreviver à crise. Para 39% das empresas, o adiamento de investimentos e novos projetos foi o caminho encontrado para se manterem abertas.
“Em âmbito estadual, houve uma redução do ICMS da energia, que foi muito importante, mas só até dezembro, e estamos pleiteando para que o Governo prorrogue isso até dezembro do ano que vem, porque às estimativas apontam que o setor de hotelaria só vai voltar aos patamares de março desse ano em novembro de 2021. Em nível municipal, ao menos em Natal, estamos solicitando uma redução do IPTU para esse ano e o próximo, porque é uma grande dificuldade para as empresas manterem o pagamento sem faturamento”, completa.
De imediato, ele afirma que os representantes do setor apostam na chegada do “novo normal”, prevista para quando, em princípio, os restaurantes e bares retomarem aos poucos as suas atividades, assim como as demais empresas na área de comércio e serviços. “A primeira coisa que precisamos é que a economia de fato volte, que os setores comecem a reabrir, para que nós possamos começar a dizer aos turistas que estamos retomando. Nenhum turista virá se os restaurantes estiverem fechados e se os passeios não estiverem sendo feitos, estamos falando de uma cadeia integrada”, destaca.
37% das cidades do RN têm plano de retomada
No Rio Grande do Norte, somente cerca de 37% dos municípios possuem um plano de ação do turismo para o período pós-pandemia. O dado é da pesquisa ‘Raio-X da Gestão do Turismo nos Municípios do RN no contexto da Pandemia‘, elaborada pela Emprotur. Participaram do levantamento 74 municípios, dos cinco polos turísticos regionais (Serrano; Agreste-Trairi; Seridó; Costa Branca e Costa das Dunas).
Entre eles, observa-se que o Polo Costa das Dunas responde pela região em que há mais municípios (71%) que dispõe de um plano voltado para o período pós-pandemia. Nos polos Serrano, Agreste-Trairi e Seridó o percentual de municípios com planos é bem baixo: 22%; 29% e 30%, respectivamente. Na Costa Branca, o percentual é de 37%.
Na percepção dos gestores respondentes, o baixo fluxo de turistas (45%), a carência de infraestrutura (44%), seguidas pela baixa qualificação dos profissionais (36%) serão as maiores dificuldades no cenário de retomada. Outros fatores devem ser destacados como a preocupação quanto aos recursos para promoção e a diversidade da oferta (equipamentos e serviços turísticos).
Quanto ao plano de retomada da Setur/RN e Emprotur, mais de 70% responderam que tiveram acesso ao “Plano de Retomada” e 26,7% responderam que não tiveram acesso ao documento. Nos polos Costa-Branca, Seridó e Serrano foi registrada a menor taxa de acesso ao plano.
Foi registrada também uma baixa participação dos conselhos municipais, somente 33% dos casos, na construção do plano de ação do turismo. Em quase todos os polos, com a exceção a Costa das Dunas (57%), a participação do conselho foi abaixo de 50% dos casos.
Os gestores apontaram as dimensões que devem ser as prioridades no plano de retomada do turismo e as ações vinculadas a ele. Medidas e protocolos sanitários foi eleita a prioridade #1, apontada por 78% dos entrevistados. Os gestores também destacaram a busca por novas parcerias com o trade (69%) e a capacitação dos destinos (63%).
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Com informações da Emprotur
Crédito da Foto: Adriano Abreu
Fonte: TRIBUNA DO NORTE