Já pensou se o plástico que jogamos fora pudesse virar algo útil em vez de sobrecarregar os lixões e poluir os oceanos? Pois é exatamente isso que pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) estão investigando. Eles querem transformar resíduos plásticos em algo valioso: hidrocarbonetos de alto valor energético, material que pode ser usado na fabricação de combustíveis alternativos, similares à gasolina que abastece nossos carros. A ideia é aplicar o processo de reciclagem química a novos contextos, ajudando a reduzir a poluição e dando um destino mais inteligente para o plástico descartado.
Desde o ano passado, cientistas do Laboratório de Tecnologia Ambiental (LabTam/UFRN) estão testando uma técnica chamada pirólise para reciclar embalagens plásticas e o alumínio que é incorporado a elas. O nome pode parecer complicado, mas a ideia é simples: aquecer o plástico em um ambiente sem oxigênio até que ele se decomponha e se transforme em um tipo especial de óleo sustentável composto por hidrocarbonetos.
Assim, em vez de virar lixo, o plástico ganha uma nova vida como matéria-prima para combustíveis sustentáveis e produtos químicos. Até agora, os testes foram feitos principalmente com resíduos plásticos industriais, que sobram na produção de embalagens. O próximo passo será aplicar essa tecnologia ao plástico pós-consumo, usado no dia a dia e que normalmente acaba em aterros ou no oceano.
Para tornar o processo mais eficiente e acessível, os pesquisadores utilizaram catalisadores de baixo custo. Em um estudo, foi empregado um óxido metálico (trióxido de tungstênio) suportado em um material de baixo custo, a cinza da casca de arroz, enquanto em outro, foi utilizado um catalisador à base de óxido de cálcio derivado de um resíduo industrial coletado em uma indústria cimenteira.

Esses elementos ajudam a acelerar a reação e direcionar a conversão dos plásticos em produtos mais úteis. “Nosso objetivo é transformar o que hoje é resíduo em um insumo de alto valor energético, permitindo que a reciclagem plástica alcance novos patamares”, explica a pesquisadora Edyjancleide Rodrigues. Os trabalhos publicados são resultado do projeto “Produção de Combustíveis Sustentáveis por Pirólise Catalítica de Misturas de Resíduos Lignocelulósicos e Polietileno”, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Os resultados até agora são animadores: a técnica pode reduzir o desperdício e diminuir o impacto ambiental dos plásticos, além de fortalecer a economia circular ao transformar resíduos em produtos de alto valor energético. O óleo de pirólise, por exemplo, pode substituir o petróleo na fabricação de novos plásticos e combustíveis, reduzindo a dependência de fontes fósseis. Isso significa que, em vez de continuar se acumulando no meio ambiente, o plástico pode voltar à cadeia produtiva de forma sustentável.
Mas, como em qualquer tecnologia nova, ainda há desafios. Um dos principais é reproduzir esses resultados em escala maior, tornando o processo economicamente viável. Para resolver isso, os pesquisadores estão investindo em reatores em escala laboratorial, com o objetivo de adquirir conhecimento sobre o processo em um TRL mais alto (sigla em inglês para Technology Readiness Level,que indica o grau de maturidade de uma tecnologia). Se essas melhorias forem bem-sucedidas, o processo poderá ser aplicado em larga escala.
Os catalisadores de baixo custo desenvolvidos nesta pesquisa permitiram a recuperação de hidrocarbonetos na faixa da gasolina energética a partir da pirólise de resíduos plásticos. Esse processo é uma alternativa viável aos métodos tradicionais de disposição de resíduos, como aterros e incineração, pois recupera materiais valiosos e contribui para a economia circular. “Devido aos resultados promissores, espera-se que essa abordagem seja aplicada em maior escala no futuro, contribuindo assim para a redução de resíduos e o fortalecimento da economia circular,” afirma José Luiz Francisco Alves, pesquisador envolvido no estudo.

De acordo com os pesquisadores, a realização de testes em reatores contínuos será essencial para entender melhor a eficiência do método e avaliar como o óleo de pirólise pode ser refinado para se transformar em combustíveis como gasolina, diesel e querosene. Além disso, os cientistas planejam testar esse combustível em motores e comparar suas propriedades com as exigências da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Brasil (ANP).
Os artigos publicados neste projeto destacam o compromisso do LabTam com a inovação em energia sustentável no setor de transporte, por meio da conversão de resíduos plásticos em combustível alternativo. Este trabalho está em conformidade com o Objetivo Estratégico 2, de inovação e empreendedorismo, e os Indicadores 10, 14 e 15 do Plano de Gestão 2023-2027. A pirólise catalítica, se bem-sucedida, pode ajudar a diminuir a dependência de combustíveis fósseis e contribuir para diversos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, como energia limpa (ODS 7), inovação (ODS 9), cidades sustentáveis (ODS 11), consumo responsável (ODS 12) e combate às mudanças climáticas (ODS 13).
Imagens: Cícero Oliveira
Fonte: Agecom/UFRN
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