Desde os primórdios, as estrelas despertam fascínio, sendo vistas como guias ou símbolos cósmicos em diferentes culturas. Na astronomia moderna, essa conexão se aprofunda com a descoberta de sistemas binários estelares eclipsantes, compostos por duas estrelas orbitando um centro de massa comum. Esses sistemas são observados quando uma estrela passa diante da outra, causando um eclipse. Cruciais para a ciência, permitem medições precisas de raios, massas e luminosidades, funcionando como laboratórios naturais para testar teorias sobre a evolução estelar e outros processos astronômicos.
Usando dados do satélite Kepler e do Transiting Exoplanet Survey Satellite (TESS), da National Aeronautics and Space Administration (NASA), pesquisa astronômica liderada pela Escola de Ciências e Tecnologia (ECT/UFRN) encontrou 75 sistemas binários eclipsantes com variações periódicas do período orbital. O estudo foi realizado pelo estudante de doutorado Jefferson Rodrigo Pereira, sob a orientação do professor Leonardo Almeida, líder do Time de Astrofísica e Exoplanetologia (TITAN) vinculado à ECT. O artigo foi publicado na revista científica britânica Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (MNRAS).
Para este trabalho, foram usados 253 alvos como amostras. As oscilações são fundamentais para o estudo de uma gama de fenômenos astrofísicos, pois podem ser causadas por fatores como a precessão apsidal, um movimento que dá a impressão de que a órbita está “girando” no referencial de um observador externo. Outras causas das variações incluem a atividade magnética estelar e o efeito gravitacional de corpos adicionais. Dependendo da massa, esses componentes extras podem ser exoplanetas, corpos celestes com características de planetas, mas localizados fora do Sistema Solar e orbitando outras estrelas.
De acordo com Jefferson Pereira, o resultado obtido é 2,2 vezes maior que os apontamentos encontrados em artigos de referência na temática. “Observamos que no catálogo de estrelas binárias eclipsantes do Kepler, investigado por Conroy e colaboradores, havia objetos com análises inconclusivas quanto à variação do período orbital devido à base temporal dos dados do Kepler ser relativamente pequena (aproximadamente 4 anos). Com isso, decidimos estudar esses sistemas para descobrir se as variações eram realmente significativas e características de um possível terceiro corpo ou não, ampliando nossa linha temporal para pelo menos 10 anos com o acréscimo dos dados do telescópio espacial TESS”, relata.
As variações encontradas nos sistemas observados foram analisadas no contexto de uma terceira componente interagindo gravitacionalmente com a binária interna. Esse elemento pode ser categorizado como um terceiro corpo, ou seja, uma estrela ou um planeta adicional que interage gravitacionalmente com o sistema binário, orbitando ao redor dele. O estudo mostra que o limite inferior da taxa estimada de candidatos a terceiro corpo ao redor de sistemas binários é de aproximadamente 30%. “Assim, como sabemos que cerca de 50% de todas as estrelas observadas são binárias, o estudo das variações dos eclipses desses objetos se torna crítico para compreendermos seus caminhos evolutivos e, consequentemente, o papel da multiplicidade estelar no status atual do nosso universo”, afirma Leonardo Almeida.
Os resultados da investigação impõem restrições importantes no estudo da multiplicidade estelar, uma área que pesquisa a presença de múltiplas estrelas em um sistema, sejam elas duplas, triplas ou em grupos maiores. A relevância se dá em várias frentes, como no processo de formação e evolução estelar, nos cálculos de massa desses fenômenos, na astrofísica e cosmologia, no estudo de exoplanetas e até na exploração de vida extraterrestre. Além disso, a descoberta se destaca por explanar a diferença entre os caminhos evolutivos das estrelas que possuem corpos ao redor e das que não possuem.
Como um produto importante, foi criado um catálogo online com todos os resultados dos 253 alvos analisados. O documento servirá de base para novos estudos do TITAN e de toda a comunidade astronômica internacional, sendo continuamente atualizado com novos dados liberados pelo satélite TESS. A pesquisa posiciona a UFRN como protagonista em um tema de relevância internacional na Astronomia.
Fonte: Agecom/UFRN