Um material para converter força mecânica em pulso elétrico e que pode também ser usado na atividade de degradação de poluentes orgânicos, “quebrando” a água – um processo que permite a produção de hidrogênio pela decomposição direta da água em seus elementos. A nova tecnologia recebeu o nome de Cerâmicas laminadas lapfimc-01 de bi4ti3o12 (bit) produzidas via tape casting aquoso e foi desenvolvida no Laboratório de Propriedades Físicas dos Materiais Cerâmicos (LaPFiMC), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais (PPGCEM-UFRN), contando com a participação de Ana Paula da Silva Peres, Wilson Acchar, Antônio Carlos Silva da Costa e Carlos Alberto Paskocimas.
O dispositivo criado é uma placa cerâmica fina, feita com o titanato de bismuto, um material ferroelétrico e também piezoelétrico. Os primeiros têm propriedades especiais, contendo regiões polarizadas em uma orientação específica, que podem ser controladas com um campo elétrico externo. Eles já são largamente usados em memórias digitais e na microeletrônica em geral. Já os materiais piezoelétricos são os que geram cargas elétricas em sua superfície, quando submetidos a uma pressão ou tensão mecânica. Esses elementos fazem parte de um enorme volume de soluções tecnológicas utilizadas diariamente pela sociedade, como, por exemplo, estão inseridos em equipamentos médicos que possuem transdutores ultrassônicos e nos sensores de movimento de smartphones.
Atualmente professora do Instituto Federal da Paraíba, Ana Paula da Silva Peres pontua que o dispositivo é importante pela adaptabilidade que o método de obtenção oferece. “Um dos principais obstáculos na aplicação é a geometria do dispositivo. Como utilizamos a colagem de fita, ou tape casting, podemos criar e produzir qualquer geometria de acordo com as nossas necessidades. A colagem de fita é um método de obtenção de filmes finos que nos permite obter um corpo cerâmico maleável e pode ser densificado em seguida, a depender da aplicação desejada”.
O depósito da patente ocorreu no ano de 2018, época em que Ana Paula realizava pós-doutorado na UFRN, na área de ciência de materiais. A concessão definitiva aconteceu na última terça-feira, 11. Ela atualmente pesquisa e vêm desenvolvendo fitas cerâmicas através do processamento de tape casting para aplicações em diversas áreas, tais como microeletrônica, materiais para uso em engenharia de tecido ósseo e liberação controlada de fármacos. Esta é a segunda concessão com a qual a docente está envolvida – a outra foi tema de reportagem no ano passado, “UFRN recebe patente de tecnologia para aplicação na área da saúde”.
A cientista detalhou que o procedimento para a preparação tem início com a mistura do pó cerâmico comercial (BIT), água e dispersante. Esta mistura é colocada sob agitação em um moinho de bolas. Então, são adicionados o ligante, o plastificante, o antiespumante e o surfactante; após esse processo, essa suspensão é levada novamente para o moinho de bolas e permanece por um período de 30 minutos a 12 horas. Antes da suspensão ser retirada, são realizados os ajustes para regular a espessura da fita a ser produzida. Logo, a colagem de fitas é efetuada a partir do movimento da superfície coletora sob uma lâmina fixa denominada doctor blade. A secagem é realizada em temperatura ambiente. Após as fitas cerâmicas serem produzidas, as mesmas são cortadas, empilhadas e laminadas de uma a cinco camadas.
Segundo Ana Paula, as propriedades dielétricas foram medidas e pôde-se comprovar que o material apresentou uma constante dielétrica em torno de 6 a 16, colocando-o como um material promissor, atendendo as necessidades de diferentes aplicações tecnológicas específicas. “Fizemos diversos protótipos e estes foram utilizados nos testes que embasaram nossa patente. Inclusive, o grupo do LaPFiMC continua a desenvolver dispositivos semelhantes, porém com outras aplicações e materiais de partida diferentes”, salienta. Ela descreve que, na época do depósito, os professores Carlos Alberto Paskocimas e Wilson Acchar, tiveram a ideia para a pesquisa e nos propuseram o desafio de desenvolver a tecnologia. “Então o grupo se reuniu, e cada um com sua expertise, colaborou para a obtenção do nosso produto final”.
Nesse laboratório, são conduzidas pesquisas com materiais cerâmicos tradicionais e avançados, usados como matéria-prima para a criação, por exemplo, de tijolos a partir do resíduo da perfuração de petróleo e de outros resíduos cerâmicos, além de produtos regionais como a xelita e a manipueira – líquido extraído da mandioca. A fabricação de fitas cerâmicas, por sua vez, divide-se em uma linha de trabalho voltada ao desenvolvimento de materiais com propriedades elétricas e magnéticas para aplicação eletroeletrônica; e outra concentrada nos biomateriais, utilizados em dispositivos médicos como enxertos ósseos, curativos e implantes para interação com os sistemas biológicos.
Usualmente, essas pesquisas resultam em pedidos de proteção intelectual, normalmente na categoria de depósitos de patente. Foram espécies deles o Tijolo Ecológico e a Construção Sustentável. O coordenador do LaPFiMC, professor Wilson Acchar, realça dois pontos no processo de patenteamento. “Um deles é a proteção da propriedade intelectual, que se mostra por si. É preservar o uso que o conhecimento da sua pesquisa indicou. O outro aspecto é que diversas fontes de financiamento adotam o número de patentes como diferencial no currículo dos pesquisadores, o que é relevante para que mais pesquisas ocorram, digamos, uma espécie de círculo virtuoso”, defende.
Imagens: Cícero Oliveira
Fonte: Agecom/UFRN