Análise: Starfield (XSX/PC) é um RPG ambicioso e imenso como o espaço

Desde os primórdios a humanidade contempla o firmamento noturno e se pergunta o que há nas estrelas, se estamos sozinhos no universo e como seria viver em outros lugares. Starfield aborda esse antigo anseio humano em um imenso e detalhado RPG de exploração e aventura espacial que propõe literalmente um universo de possibilidades para cada um viver sua jornada pessoal rumo às estrelas.

Das profundezas da subsolo ao espaço sem fim

A campanha se passa no ano de 2330 e inicia nas minas de Vectera, em um canto da Via-Láctea localizado a aproximadamente 50 anos luz do Sistema Solar. Durante as escavações, encontrou-se um misterioso artefato incrustado nas rochas e nossa personagem é encarregada de extrair o material.
Ao tocá-lo, somos tragados por uma experiência surreal psicodélica, vislumbrando algo que não é possível descrever com precisão. Após o ocorrido, somos recrutados pela Constelação, um grupo científico de pesquisa e exploração que visa desvendar o mistério dos artefatos, contando com nossa experiência incomum para tentar entender um pouco mais o que aconteceu.

Ao sair das minas somos apresentados a, literalmente, uma imensidão de possibilidades e coisas novas para explorar em um universo rico e complexo. Você pode ser um xerife espacial estilo Galaxy Rangers, ou um caçador de recompensas Mandaloriano com jetpack e rifle laser, ou um ronin espacial que luta com katana e artes marciais ou um fazendeiro de minérios, contrabandista, mecânico de naves, policial, pirata, justiceiro ou simplesmente sair por aí fazendo o que você quiser. O universo é seu.

O militar, o corporativo, o criminoso e o divino

Cerca de duas décadas antes do acontecimento nas minas de Vectera, houve uma guerra feroz entre as duas principais facções de humanos, a União das Colônias e a Aliança Freestar. Atualmente vivemos em um período de paz entre essas facções, com muitos ressentimentos pela morte de entes queridos em ambos os lados.
Além disso, temos outros grupos importantes como os piratas da Frota Escarlate, o grupo corporativo Ryujin, diversas organizações mercenárias e paramilitares, além de três religiões principais: os Iluministas, o Sanctum Universum e a casa Va’ruun.

O jogador é livre para aderir a um ou mais desses grupos, ou nenhum deles se preferir um estilo de vida independente. É possível fazer missões e receber recompensas relacionadas a todas essas facções e resolver (ou piorar) conflitos entre elas. Essas sidequests podem ser feitas a qualquer momento da campanha principal, que pode ser retomada quando o jogador desejar.

Os mistérios do Universo

A trama principal de Starfield é bastante instigante e só melhora com o tempo. Para mim, essa é a sua maior virtude, além de seu imenso conteúdo. Por ser um título extremamente complexo, o início é arrastado, com muitos sisteminhas para aprender e uma interface pouco intuitiva que não ajuda muito quem não está acostumado com jogos da Bethesda.
Porém, com o passar do tempo a experiência vai melhorando e quando menos se espera você está completamente fisgado pela trama e por tudo o que Starfield tem a oferecer. Ao longo da campanha descobrimos que não somos os únicos atrás dos artefatos: um misterioso e poderoso grupo de inimigos surge e ficamos na dúvida se se tratam de alienígenas, humanos com tecnologia do futuro ou se não é nada disso.

Ficamos sabendo também que a Terra está devastada e hoje é um planeta estéril. Ao longo da campanha descobrimos a verdade por trás do trágico destino da casa da humanidade. Desvendar os segredos do que realmente está acontecendo instiga o jogador a querer se aprofundar mais e mais na campanha.

Durante nossa jornada percebemos que não se trata apenas de descobrir o que os artefatos são, mas sim desvendar os segredos do universo, fazendo com que o jogador questione suas convicções éticas, religiosas e até mesmo nosso papel no mundo. O final da campanha é muito interessante, podendo fazer com que o jogador mude suas perspectivas sobre muitas de suas crenças até então. O roteiro consegue fazer com que o jogador sinta-se realmente especial ao desvendar o mistério central.
Assim como muitos jogos, Starfield possui um recurso de New Game Plus, porém aqui ele é totalmente integrado e explicado pela trama principal, e o jogador é incentivado a fazê-lo. Nesse caso, uma escolha poderá fazer com que você reviva toda a aventura, ou modifique as condições do início da história, já que ele conhece seus segredos. Se preferir, também pode continuar no progresso atual. Essa escolha tem implicações até nos relacionamentos românticos que o personagem tenha vivenciado.

Eu levei aproximadamente 40 horas para terminar a campanha principal pela primeira vez, focando em resolvê-la e ignorando a maioria das sidequests. Eu o fiz para conseguir completá-la em tempo hábil para escrever esta análise, mas definitivamente recomendo que você jogue sem pressa, descobrindo as coisas por si e fazendo as sidequests que mais lhe agradam, especialmente aquelas envolvendo facções. Praticamente toda missão tem múltiplos finais que dependem das atitudes do jogador, que pode resolver os conflitos usando diplomacia, malandragem, lábia ou força bruta.

Imenso como o espaço

Um dos pontos mais criticados do jogo é o vazio da maioria dos milhares de planetas que podemos visitar. Isso ocorre porque, com milhares de estrelas e planetas para se visitar, obviamente seria impossível criar conteúdo manual personalizado para cada um deles. Para que as coisas fiquem um pouco mais interessantes, o jogo faz algumas concessões com a realidade, fazendo com que cerca de 10% dos planetas tenham vida e muitos deles possuam uma ou duas instalações criadas proceduralmente, variando entre fazendas, minas, entrepostos, cemitérios de robôs, laboratórios abandonados entre outros.

O conteúdo gerado proceduralmente não é ruim, mas obviamente não é tão interessante quanto aquele criado manualmente. Felizmente existe bastante material dedicado, afinal a Bethesda tem trabalhado há mais de duas décadas nesse desenvolvimento. Starfield conta com três cidades principais muito grandes e cheias de vida e atividades, cada uma com um estilo próprio muito característico, além de diversas localidades menores.

Nova Atlântida é a capital da União das Colônias, rica, movimentada e moderna, que agradará a fãs de ficção científica clássica. Já Neon é uma cidade do pecado, voltada para prazeres e vícios, com um estilo underground que certamente agradará a fãs do gênero Cyberpunk. Por fim, Akila foi fundada pelos primeiros colonizadores humanos, ela tem um curioso estilo “Velho Oeste” retrofuturista que conquistará os fãs do gênero faroeste espacial.

Cada uma dessas cidades possui uma quantidade imensa de atividades para fazer e cantinhos para explorar. Infelizmente a exploração fica prejudicada pela falta de um mapa, obrigando o jogador a memorizar a localização dos pontos importantes. A ausência do minimapa nas cidades é uma mancada que foi ponto de reclamação da maioria dos jogadores, incluindo a mim, e a Bethesda já anunciou que está trabalhando nisso.

Outro problema chatinho é o excesso de telas de carregamento, um mal que não é o fim do mundo, mas quebra a imersão do jogador. Os loadings em si não são muito demorados, o problema é que são muito frequentes. Transitar para dentro de qualquer ambiente fechado, seja uma casa, uma loja, ou sua nave, requer um carregamento para entrar e outro para sair. Cidades grandes como Nova Atlântida e Neon exigem loadings até mesmo para acessar áreas diferentes, mas esses pelo menos estão disfarçados com elevadores e linhas de metrô.

Grand Theft Starship

O gameplay é feito em primeira ou terceira pessoa com três opções de câmera no total, algo que eu considero muito positivo por permitir que o jogador escolha a opção que lhe deixe mais confortável.
Os combates envolvem armas de fogo ou luta corpo a corpo em um esquema muito similar a um FPS ou TPS (dependendo da sua escolha de câmera). Embora seja um RPG e não um jogo de tiro, o gunplay de Starfield é bastante agradável e divertido. São oferecidos ao jogador diversos tipos de armas, que podem ser customizadas e personalizadas, tornando-as equipamentos únicos. Eu pessoalmente decidi que minha personagem seria uma ronin espacial, focando minha árvore de habilidades nisso e abatendo oponentes com a katana no meio de tiroteios com fuzis a laser.

Eu gostei também do combate de naves, que é bastante simples e tem elementos de gerenciamento de energia em tempo real, que me lembraram muito os combates de Starfleet Academy (PC), outro jogo que eu adoro. É possível comprar habilidades para fazer manobras mais agressivas e travar armas em sistemas específicos do inimigo para desabilitá-los sem explodir tudo.

As naves em si são um universo à parte, praticamente um jogo dentro do jogo. É possível comprar, vender, projetar e até mesmo roubar naves. O roubo de naves é uma atividade especialmente divertida, que pode ser feita no espaço (desabilitando motores e invadindo a nave a ser roubada, uma versão espacial de pirataria) ou em terra, em que precisamos “cuidar” da tripulação antes de tomarmos o veículo para nós.

Há também sistemas complexos de pesquisa, a possibilidade de adquirir e decorar uma casa, além da montagem e gerenciamento de entrepostos. Infelizmente não tive tempo de me aprofundar nessas mecânicas, mesmo terminando o jogo duas vezes e com quase uma centena de horas jogadas. A quantidade de conteúdo é impressionante, sinto que sequer arranhei a superfície do que Starfield tem a oferecer, o que é algo bom e que tem potencial para entreter jogadores por anos.

Cenários lindos e música orquestral

Um ponto a ser elogiado é a excelente dublagem, que dá vida aos modelos 3D esquisitos típicos da Bethesda, que fazem os NPCs menos importantes parecerem bonecos bizarros. A trilha sonora orquestrada é magistral e combina perfeitamente com a temática do jogo, assim como os efeitos sonoros detalhados que dão muito mais realismo às ações da personagem. Os efeitos de tiros, portas abrindo, objetos tecnológicos e som das naves são realmente muito bons e ajudam na imersão.

Outro ponto a elogiar é o capricho e atenção aos detalhes na modelagem de estruturas, naves e objetos, com polimento impecável nesse aspecto. Cada item do jogo possui detalhes extremamente bem trabalhados e realistas nos mínimos detalhes.

Os cenários são belíssimos, tanto nas cidades quanto no espaço. O detalhamento dos planetas e estruturas é admirável, e certamente o jogador ficará tentado a interromper seu gameplay para tirar belas fotos, que renderão lindos papéis de parede.
Sobre a questão de desempenho, no Xbox Series X o jogo rodou com taxa de quadros estável a 30 fps e gráficos muito bonitos. Apesar de não ser o ideal, a taxa de quadros não causou estranheza ou problemas de desempenho, mantendo a jogabilidade agradável pela maior parte do tempo, com raríssimas quedas de desempenho.

Joguei também em um PC com configurações próximas aos requisitos mínimos e tive um desempenho similar, mas com qualidade gráfica muito inferior. Presenciei alguns bugs estéticos, principalmente envolvendo anatomias estranhas por parte dos NPCs, mas nada que comprometesse o jogo. Durante meu gameplay não ocorreu nenhum travamento ou bug que comprometesse o progresso da jogatina em nenhuma das plataformas.

Um RPG estelar

Starfield é um RPG imenso, que dá a oportunidade para o jogador ser quem quiser e explorar um vasto universo adaptando a jogabilidade ao seu estilo, explorando apenas as mecânicas que mais gostar. Certamente não é perfeito, mas seus defeitos importam cada vez menos à medida que o jogador é absorvido pela imensa quantidade de atividades e conteúdo à sua disposição. Starfield é uma experiência que não deve ser jogada, mas sim vivida, e tem conteúdo suficiente para entreter o jogador por anos como seu simulador de vida no espaço.

Prós

  • Roteiro instigante, que faz o jogador refletir sobre os mistérios do universo, da vida e sua conduta ética;
  • Quantidade imensa de conteúdo para explorar;
  • Extrema liberdade para o jogador montar o personagem e jogar da forma que quiser;
  • Possibilidade de alternar a qualquer momento entre visões em primeira e terceira pessoa;
  • Combates divertidos, tanto em batalhas terrestres quanto no espaço;
  • Dublagem, trilha sonora e efeitos de áudio primorosos.

Contras

  • Curva de aprendizado muito lenta, o começo do jogo é cansativo, embora melhore muito quando você se habitua com a complexidade das mecânicas;
  • Interface pouco intuitiva e chata de lidar;
  • Ausência de mapas para navegação nas cidades e planetas;
  • Excesso de telas de carregamento.
Starfield — XSX/PC — Nota: 9.0
Versões utilizadas para análise: XSX e PC

Análise feita por Vítor Tibério

Fonte: GameBlast

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