“Mãe, faça meu coque, porque a professora já chegou”. O pedido é da pequena Yasmin Sophia, de 4 anos. Apaixonada por ginástica rítmica, a garotinha insistiu tanto que a mãe, a autônoma Shirley Silva, de 42 anos, decidiu procurar a professora Karissa Miranda para inscrever a filha no projeto criado em 2014 com o intuito de popularizar o esporte nas comunidades de Natal. Dividida em dois polos e em um centro de rendimento, a Associação de Ginástica de Natal (Aginat) atende gratuitamente a mais de 100 meninas nos bairros de Mãe Luiza, na zona Leste da capital, e Cidade da Esperança, na zona Oeste, numa trajetória que tem revelado talentos e transformado vidas.
Pelas regras do projeto, os polos devem receber meninas dos 5 aos 16 anos, que estejam matriculadas regularmente na escola e tenham interesse pelo esporte. Com o sucesso da iniciativa, no entanto, a procura tem extrapolado os limites de idade. Foi assim que a mãe da pequena Yasmin conseguiu uma vaga para que a menina participasse das aulas, que ocorrem todas as terças e quintas-feiras no ginásio Arena do Morro, em Mãe Luiza. “Ela entrou em fevereiro deste ano. Quando procurei saber se poderia matriculá-la, fui muito bem acolhida”, conta Shirley.
“A professora explicou que a idade mínima para participar do projeto é 5 anos, mas Yasmin pediu tanto para estar aqui que a professora abriu um espaço”, conta Shirley. A professora a que se refere a autônoma é Karissa Miranda, uma das fundadoras do projeto. Formada em Educação Física, Miranda criou a Aginat junto com outras quatro professoras: Gilmara Lira, Laryssa Souza, Ana Luíza D’Oliveira e Kalline Miranda, irmã de Karissa e idealizadora da ação. “O objetivo era massificar e popularizar essa modalidade que a gente só vê, praticamente, na televisão e nas escolas privadas”, detalha a professora.
“A ginástica rítmica sempre foi considerada um esporte elitizado e nosso sonho era trazer a prática para as comunidades e para a rede pública de ensino de Natal”, acrescenta Miranda. Atualmente, o projeto contabiliza 60 componentes no polo de Mãe Luiza e cerca de 55 na Cidade da Esperança. Já o centro de rendimento, no Tirol, é o local para onde vão as meninas que buscam participar de competições oficiais. Nem todas elas, no entanto, são descobertas nos polos.
“Nós somos como olheiras. Nos polos, as meninas que se destacam e que querem, são encaminhadas para serem lapidadas. Contudo, nem todas aceitam ir para o centro, porque lá existe um treinamento mais intenso, às vezes, todos os dias, especialmente às vésperas de competição. Aqui de Mãe Luiza, já mandamos mais de 15 meninas para o rendimento. Hoje, Marcelle Silva é a representante da comunidade”, conta a professora e fundadora da Aginat.
Para se manter, o projeto recebe patrocínio de algumas empresas e conta com o apoio do Governo do Estado e da Prefeitura do Natal. Além disso, algumas ações são realizadas a fim de angariar recursos. “Fazemos bazar e cantinas em eventos. Estamos sendo reconhecidos nacionalmente e internacionalmente e isso tem chamado a atenção de empresas”, detalha Miranda.
A ginástica rítmica é um esporte olímpico que combina elementos de balé, dança teatral e da própria ginástica comum. A execução dos movimentos corporais deve combinar a harmonia da música com movimentos coordenados de aparelhos da modalidade, como corda, arco, maça (dupla feita de madeira ou material sintético com formato assemelhante ao de uma taça de champagne, com uma haste longa) e fita.
“Pretendo seguir carreira”, diz integrante Cibelly Batista chegou ao projeto quanto tinha nove anos, após pedir à mãe que a levasse à Arena do Morro, local onde acontecem os treinos em Mãe Luiza. Apaixonada pelo esporte desde sempre, a garota, hoje com 13 anos, afirma sonhar com uma carreira profissional e aspira viajar o mundo em torneios. “Meus planos são evoluir. Pretendo seguir uma carreira profissional e participar de competições lá fora. Conheci uma atleta daqui (Marcelle), sei que a agenda é dela bem corrida”, diz a adolescente.
A ginasta conta que tem se esforçado para conseguir uma vaga no centro de rendimento da Aginat. “Treino aqui às terças e quintas e em casa todos os dias”, fala Cibelly, ao recordar com entusiasmo a primeira apresentação que fez pelo projeto. “A Arena [do Morro] estava cheia. Fiquei nervosa no começo, mas deu tudo certo. Sempre gostei de ginástica rítmica, tanto que ficava procurando filmes com o tema para assistir”, admite.
Já Shirley Silva, mãe da pequena Yasmin, ressalta o quanto a menina está empolgada com o projeto. “Estou muito realizada por ela, porque Yasmin é empenhada e tem se estimulado a fazer o que gosta”, pontua. A menina faz coro à mãe. “Gosto daqui, porque eu treino, fico forte. Quando crescer, vou continuar fazendo ginástica e viajar”, planeja a pequena.
Com o sucesso do projeto, Karissa Miranda conta que, desde abril deste ano, não há mais vagas para receber novas alunas em Mãe Luiza. Segundo ela, a possibilidade de ampliar o número de ginastas tem sido avaliada. “Estamos estudando abrir mais turmas, mas temos que pensar em quanto isso vai demandar em custo com as roupas para as apresentações, afinal, ninguém pode ficar de fora. Os patrocínios e incentivos públicos têm ajudado muito. É por meio deles que nós conseguimos as roupas e aparelhos para os polos”, afirma a professora.
Karissa Miranda explica que as regras para participar das aulas nos polos são simples: basta que os responsáveis levem os documentos solicitados da criança, que precisa, obrigatoriamente, estar matriculada na escola. Também são solicitados o comprovante de residência e a declaração escolar. Outro pré-requisito é a assiduidade nos treinos. “Não adianta vim para uma aula e faltar dez. Se isso acontecer, a aluna perde a vaga. É importante dizer que existe uma fila enorme de espera”, esclarece a fundadora da Aginat.
A participação no centro de rendimento, por sua vez, depende do desempenho da ginasta nos polos. “É lá [no centro de rendimento] que está nossa elite, digamos assim. São os nossos tesouros, que se destacam e podem ser lapidados”, complementa Miranda, que divide as atividades do projeto com as demais fundadoras.
Competições
Ao longo de quase uma década, a Aginat já participou de diversas competições nacionais e internacionais. O resultado dos esforços são diversas premiações para o Rio Grande do Norte. Uma das competições é o Torneio Regional de Ginástica Rítmica, que termina neste domingo (10). O evento ocorre em Lauro de Freitas, na Bahia e reúne 420 ginastas do Nordeste, com representações de oito estados (somente o Piauí ficou de fora). Marcelle Silva, que compõe a equipe da Aginat no torneio, ficou em 2º lugar geral do nível II (pré-infantil), categoria de atletas com 9 e 10 anos.
Com a classificação, Marcelle, revelada no polo de Mãe Luiza, garantiu vaga na etapa nacional, assim como as meninas da categoria Conjunto Infantil do RN, que ficou em primeiro lugar. Outras conquistas também são celebradas pelo projeto. “Já participamos do Mundial na Rússia e fomos campeãs sul-americanas no ano passado. No Jogos da Juventude de 2023, fomos segundo lugar por equipe, um feito histórico para o Rio Grande do Norte”, conta Karissa Miranda, ao celebrar: “Conseguimos alavancar a ginástica rítmica do nosso País, desde os polos até nossa equipe de rendimento e estamos sendo reconhecidas internacionalmente”.
Apesar das conquistas, a professora revela que ainda não existem atletas, no âmbito do projeto, que conseguem viver exclusivamente do esporte, algo que, na avaliação dela, deve mudar em breve. “Talento as meninas têm e eu acredito que, logo elas vão chegar lá”, prevê. Além das conquistas recentes, em 2021 a Aginat comemorou o ouro no Torneio Nacional de Ginástica Rítmica. À ocasião, Ana Carolina Nascimento de Lima garantiu medalha de ouro no Conjunto juvenil. A adolescente, que não participa mais do projeto, havia integrado o polo de Mãe Luiza no início dos treinos. A professora Karissa Miranda diz que as conquistas são um sinal do quanto o projeto está transformando as crianças atendidas.
Crédito da Foto: Magnus Nascimento
Fonte: TRIBUNA DO NORTE