Lançado em 2023 pela Feperd Games para PC, Spark the Electric Jester 3 mantém a continuidade das ideias de seu antecessor ao reintroduzir o protagonista do primeiro jogo. Após ajustar conceitos que não demonstraram tanta eficácia no título anterior e aprimorar as mecânicas previamente experimentadas, o resultado é um jogo que, embora revele suas limitações orçamentárias, ainda preserva a diversão de uma jogabilidade de plataforma ágil e repleta de possibilidades.
O bobo elétrico retorna
Os acontecimentos em Spark 3 desdobram-se como uma continuação direta do que ocorreu na prequela. Após a derrota de Freom pelas mãos de Fark, o mundo fica diante de uma possível ameaça chamada Clarity, uma inteligência artificial com intenções misteriosas. Para enfrentar essa situação, Fark estabelece a Fark Force (F.F.), uma organização com o objetivo de neutralizar essa ameaça e garantir a segurança global.
Contudo, essa abordagem acaba assumindo um viés ditatorial, resultando no desligamento das redes de comunicação em todo o mundo e na opressão da sociedade. Todo esse caos acaba levando Spark, o protagonista do primeiro jogo, a assumir a liderança da situação, buscando deter a Fark Force e descobrir as atividades ocultas por trás dos acontecimentos.
No entanto, a maneira como a trama é apresentada é um tanto quanto estranha. Algumas cenas são intercaladas no início ou ao final de certas fases, variando entre simples animações in-game ou apresentações por meio de imagens em pixel art com narração. Semelhante aos jogos anteriores, não há presença de voice acting durante as cenas.
O controle da correria
Continuando com a jogabilidade de plataforma 3D em alta velocidade, a base de Spark the Electric Jester 3 não difere muito do que foi apresentado no segundo título. O protagonista mantém a capacidade de correr em alta velocidade, realizar pulos duplos para alcançar grandes alturas, executar ataques leves e fortes, além de poder realizar ataques direcionados e grudar nas paredes, permitindo saltos consecutivos. No entanto, todos esses movimentos estão mais intuitivos de controlar, resultando em um equilíbrio melhor entre a fluidez do controle do personagem e a necessária precisão.
Além disso, uma adição que enriquece o design dos níveis é a inclusão dos corrimões, os famosos grind rails. Eles operam de maneira similar aos jogos tridimensionais do Sonic, proporcionando caminhos alternativos e aprofundando a complexidade dos desafios presentes nas fases. O conceito de momentum também se aplica aos corrimões, assim como ao chão, sendo uma ferramenta valiosa para superar os obstáculos de plataforma.
Spark pode correr pela parede agora, como um verdadeiro praticante de parkour.
O jogo também introduz alguns momentos de jogabilidade diferenciados, como assumir o controle de um carro e de uma nave. A tentativa é louvável, porém, essas ocasiões não proporcionam o mesmo nível de diversão e funcionalidade encontrados ao controlar diretamente o personagem principal.
Polimentos necessários, mas insuficientes
A maior parte das mudanças impactantes se concentra no sistema de combate, que parcialmente eliminou o sistema de Jester Power, que era responsável por conceder habilidades especiais a Spark e Fark. Para inserir uma maior variedade nos ataques do personagem, uma loja é disponibilizada ao longo do jogo, na qual os bits coletados durante as fases podem ser utilizados para adquirir novas sequências de combos, habilidades que beneficiam tanto os confrontos quanto os momentos de plataforma.
Apenas um Jester Power antigo está incluso no game. Agora a nomenclatura serve como seleção para outros personagens
Outra mudança está relacionada ao sistema de defesa. Em Spark 2, essa defesa funcionava como uma barreira, capaz de ser usada durante o movimento para evitar armadilhas. Em Spark 3, essa defesa transformou-se em uma ação restrita ao combate, exigindo que o protagonista pare completamente para ativá-la. No entanto, ela agora incorpora um sistema de parry, no qual pressionar o botão no momento certo durante o ataque de um inimigo permite abrir a guarda dele para oportunidades de contra-ataque.
Apesar das melhorias implementadas, o combate é desajeitado em certos momentos,, e na maioria dos casos, o mero pressionar de botões de maneira repetitiva pode ser mais eficaz do que executar sequências de combos mais elaboradas. Esse aspecto é agravado pela simplicidade das animações e pela falta de impacto perceptível nos ataques.
O ápice mais notável do sistema de combate ocorre durante as batalhas contra os chefes, as quais apresentam uma notável melhoria em relação ao jogo anterior. Essas batalhas são mais diversificadas e algumas se mostram até mais inventivas, não se resumindo a batalhas em arenas circulares com pouca variação.
O nível de desafio é geralmente moderado nas dificuldades normais, mas é possível ajustar o grau de desafio de forma independente entre as batalhas e as seções de plataforma. A exceção se dá na última área, que é um verdadeiro teste de habilidades com direito a sistema de vidas e sem save até terminar o game.
Reorganizando
Uma alteração significativa no ritmo do jogo ocorre na estrutura das fases, agora organizadas em áreas que combinam fases maiores, estágios menores e alguns desafios que funcionam como tutoriais. Cada área apresenta um estágio principal, cuja conclusão é requisito para desbloquear as demais. Além disso, para progredir para a próxima área, é preciso acumular uma quantidade específica de Freedom Medals, que são obtidas ao completar os níveis.
Para incentivar o retorno do jogador a estágios concluídos, cada nível possui algumas metas, como tempo de conclusão, pontuação geral e medalhas coletadas.
A fase principal se apresenta como um estágio extenso, composto por várias seções e gimmicks que são gradualmente introduzidos. Já os estágios menores consistem em missões que variam desde atingir o final do percurso até coletar uma quantidade específica de medalhas, completar desafios de tempo, entre outros objetivos.
Aparência básica, mas funcional
Spark 3 apresenta uma direção visual mais refinada. Apesar de elementos como texturas e geometria serem básicos, a direção de arte e as capacidades de iluminação da engine conseguem habilmente camuflar as limitações orçamentárias do título, mas a aparência de “jogo da Unity” se mantém. Vale ressaltar que o game ainda é, majoritariamente, resultado do trabalho de uma única pessoa — Felipe Ribeiro Daneluz, também conhecido como LakeFeperd — e continua a ser impressionante o que ele conseguiu realizar por conta própria.
O que se destaca no jogo são as abordagens temáticas, como por exemplo uma fase que ocorre durante um protesto urbano, e outra dentro de instalações que simulam um espaço virtualmente, transformando a vista à medida que o protagonista avança pela área, evitando temas comuns como ambientações de fogo, gelo, entre outros.
A trilha sonora, embora menos marcante que a do jogo anterior, continua a alta qualidade da franquia, mantendo a variedade e casando muito bem com a ação.
Divertido e acessível
Ampliando as qualidades que fizeram do segundo jogo uma experiência tão divertida e abordando algumas falhas, Spark the Electric Jester 3 se estabelece como uma aventura empolgante que coloca um foco especial na exploração da movimentação e da física “flutuante” de Spark. O controle ainda mantém uma leveza um tanto exagerada, exigindo um período de adaptação para dominar completamente a jogabilidade; no entanto, esse aspecto não diminui o brilho do resultado final.
É um indie excelente e um dos jogos brasileiros mais legais disponíveis no mercado. Além disso, ele é acessível, com um preço de apenas R$24,49 no Steam, podendo ficar ainda mais em conta durante promoções.
Prós:
Aprimoramentos no gameplay ajudam bastante no controle do protagonista em comparação ao segundo jogo;
Fases criativas, com temáticas mais distintas;
O sistema de loja dá uma melhor utilidade a moeda do jogo;
Estrutura de áreas ajuda no ritmo da aventura;
Revisitar as fases para encontrar melhores rotas e medalhas continua sendo divertido.
Contras:
Falta de identidade visual;
Combate continua um tanto desengonçado;
As sessões de veículo não são tão divertidas;
Falta de tradução em português, mesmo sendo um jogo brasileiro.
Lúcio Amaral é jornalista e advogado pós-graduado em Direito e Processo Trabalhista. Certificado de Estudos Aprofundados em Psicanálise. Ganhador do II Prêmio de Rádio e Jornalismo em Saúde e Segurança do Trabalho, promovido pelo MPT em 2008.