Para muitos profissionais, o retrato do mercado de trabalho é definido pela necessidade diária de deslocamento até cidades vizinhas, o que, na demografia, denomina-se movimento pendular. Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), publicada na Revista Portuguesa de Estudos Regionais, buscou entender os fatores que contribuem para esta realidade e analisar suas causas a partir da utilização de informações dos microdados dos Censos Demográficos de 2000 e 2010, disponibilizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O trabalho, realizado pelo demógrafo João Gomes da Silva, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Demografia (PPGDem/UFRN), juntamente com os professores Silvana Nunes de Queiroz e Ricardo Ojima, do PPGDem, observou que o perfil das pessoas que se deslocavam no começo do século era de idade acima dos 34 anos, com um aumento dessa faixa etária na década seguinte. Para este grupo, foi constatada uma renda salarial maior, o que embasa um dos motivos da opção pela mobilidade. Embora a renda média do censo mais recente demonstre uma queda nesse valor, se comparado ao levantamento anterior, ainda assim, os trabalhadores praticantes da mobilidade intermunicipal possuem ganhos que se sobressaem aos que têm vínculo empregatício no município onde habitam.
“Diante do perfil que se revela para o trabalhador brasileiro, foi possível evidenciar quem são os indivíduos praticantes de cada tipo da mobilidade intramunicipal e intermunicipal, além dos que também não realizam nenhum tipo de movimento espacial, mediantes os achados descritivos mensurados com as informações dos Censos Demográficos de 2000 e 2010. Traçar as características desses trabalhadores é algo essencial para desvendar não só os atributos pessoais de cada indivíduo, mas também em que espacialidade estão inseridos. São investigações que agregam nas descobertas de novos comportamentos e padrões dos deslocamentos populacionais no Brasil”, explica o artigo.
Foi verificado que, no cenário do mercado de trabalho no ano de 2000, ainda havia um expressivo contingente de pessoas trabalhando próximo ao local de residência. Um dos motivos pode ser atribuído ao reflexo da concentração do investimento ou, mesmo, da precarização dos meios de locomoção entre os lugares. Além do número significativo de pessoas que não realizavam nenhum tipo de deslocamento espacial por motivo de trabalho, percebe-se, também, que a maioria dos que praticavam eram homens. Contudo, as mulheres mostraram um comportamento diferente nos anos posteriores.
A análise mostra, também, que os trabalhadores apresentaram melhoras nas condições educacionais com predominância de curso superior. De acordo com o estudo, isso pode, em parte, ter sido o fator essencial para que houvesse uma maior dinamização do mercado de trabalho brasileiro e a presença de profissionais com qualificação superior em ocupações específicas. No entanto, os pesquisadores não descartam outras justificativas para as mudanças no mercado, já que, segundo eles, alguns setores ganharam destaque, o que não coincidiu com a oferta de mão de obra adequada.
“Além disso, devido às políticas educacionais e de interiorização do ensino, implementadas a partir dos anos 2000, constatou-se diferenças no perfil daqueles que trabalham em município diferente de onde residem, especificamente no nível de instrução e, consequentemente, nos rendimentos em comparação aos que trabalham no município onde residem. Isso porque os trabalhadores praticantes da mobilidade intermunicipal, em geral, são mais qualificados e conseguem se inserir em vagas ofertadas em outros municípios. Portanto, isso faz com que as pessoas menos qualificadas permaneçam e ocupem cargos menos remunerados no local de origem, mas esse cenário tem mudado com as práticas incorporadas com as políticas de incentivo à qualificação para o trabalhador nesse período analisado”, afirma.
Os pesquisadores destacam, ainda, que a mobilidade intermunicipal, motivada por trabalho, está cada vez mais presente em áreas não metropolitanas do país. “Isso mostra que as grandes cidades estão perdendo, em certa medida, o caráter atrativo, além de que esse tipo de mobilidade não é somente típico de áreas metropolitanas, porém, se espalha pelos diferentes territórios do país, atingindo cidades interioranas, metrópoles distantes da faixa litorâneas e considerando a região Nordeste como um grande celeiro da mobilidade intramunicipal e intermunicipal por motivos laborais, mesmo ainda em proporções secundárias”, finaliza.
Fonte: Agecom/UFRN