É muito comum que um empreendedor que teve uma grande ideia fique preocupado ao compartilhá-la. Para acabar com o medo de ter o projeto roubado, muitos pensam em registrar uma patente – concessão pública que garante ao criador a exclusividade de comercialização da sua ideia.
Um movimento recente na UFRN intensifica a aproximação entre o empreendedorismo e o patenteamento de novas tecnologias. Iniciativas brotam nesse sentido. Três delas foram selecionadas no mês de dezembro na fase final do Programa Centelha, ação do Sebrae cujo objetivo é estimular a criação de empreendimentos inovadores e disseminar a cultura empreendedora no Rio Grande do Norte.
José Heriberto Oliveira do Nascimento participa de uma dessas, a NanoUp. A empresa é pré-incubada na Tecnatus e atua na produção de nanomateriais via upcycling para aplicação na indústria 4.0. A startup tem raiz em dois depósitos de pedidos de patente em que Heriberto é autor junto com Rivaldo Leonn Bezerra Cabral, parceiro na NanoUp e orientando seu no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química da UFRN. Contudo, o professor do Departamento de Engenharia Têxtil, que é autor de outros nove depósitos, enfatiza que, no caso dele, é uma necessidade sempre pesquisar com a finalidade de desenvolver produtos e processos com aplicação industrial.
“Pesquisar pensando na indústria 4.0 e 5.0 sempre é o objetivo das pesquisas que proponho para meus alunos. A empresa veio logo após da sexta patente depositada, pesquisamos a capacidade de mercado delas e logo, veio a Ideia da NanoUp, que tem a finalidade de obter nanomateriais de alto valor agregado de resíduos. Mas fizemos antes uma pesquisa de mercado para avaliar a demanda. E deu certo”, ressalta Heriberto.
O caso dele é exemplar para o fato de que, mesmo ainda sem a concessão da patente para todos os inventos, os autores já possuem prioridade para uso dos produtos da pesquisa. Ou seja, como não há nenhuma solicitação de patente anterior a respeito das mesmas descobertas, os pesquisadores que depositaram o pedido no Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) já possuem a preferência dentro do país na utilização dessas invenções.
É a situação também da MicroCiclo, cujo início das atividades remete à BioInova, incubadora de empresas vinculada ao Centro de Biociências (CB) e ao Centro de Ciências da Saúde (CCS). A empresa propõe uma solução para o acúmulo de resíduos tóxicos ou contaminações baseada na bioremediação – método que consiste no uso de organismos vivos, principalmente microrganismos, para degradar contaminantes tóxicos em formas menos tóxicas. Da solução veio um produto que deu origem a um depósito de pedido de patente no mês de dezembro de 2021.
“A ideia era formular um produto composto por bactérias do acervo do laboratório que apresentassem a melhor atividade de degradação de óleo. Submetemos a proposta de biorremediação ao Edital Conecta Startup Brasil. O programa conectou a Microciclo a uma empresa metalúrgica de Santa Catarina interessada na solução para tratar os resíduos oleosos industriais”, fala Kamilla Silva-Barbalho, diretora de tecnologia e também co-fundadora da empresa. A iniciativa ganhou reconhecimento internacional, a ponto de as empreendedoras comporem a delegação brasileira que participou da Conferência Climática (COP27) no mês de novembro, no Egito. Apesar dos desafios, Carolina Fonseca Minnicelli, também co-fundadora da MicroCiclo, fala que a busca de estratégias e possibilidades para crescer e chegar ao mercado é a tônica atual da empresa.
“Investidores que normalmente investem em inovação em outras áreas não estão tão familiarizados com os riscos que envolvem o investimento em startups de biotecnologia. Apesar disso, há de fato uma mudança de mentalidade na área de biotecnologia. Na nossa visão, a mudança ocorre por meio de incentivos institucionais, como o programa de pós-graduação Renorbio, atuante nas diferentes áreas da Biotecnologia, a Fundação Biominas, que tem um programa de capacitação empreendedora de pesquisadores, e o Biotechtown, aceleradora de startups de biotecnologia. Além disso, os editais de fomento são importantes para impulsionar esses empreendimentos baseados em pesquisa”, lista Minnicelli.
Uma ação contemporânea é a Isnano. Assim como a MicroCiclo, foi criada durante a primeira edição do Centelha RN, em 2020, e com incubação realizada na BioInova, contudo, em uma área de atuação diferente, pois pensada sob a proposta de fomentar o mercado farmacêutico para cosméticos, saúde humana e animal, com insumos nanotecnológicos voltados sobretudo para para farmácias de manipulação. Com dez pedidos de patente depositados, um dos fundadores da empresa, Arnóbio Antônio da Silva Júnior, fala que a própria criação da ISnano se deu a partir de um processo natural de maturação do grupo de pesquisa e de uma ação indutora da UFRN de estímulo à participação de grupos que tinham depósitos de patentes em editais de empresas.
Ele conta que a expertise da startup é uma consequência do trabalho desenvolvido na UFRN e que o processo de pré-incubação vivenciado até o ano passado incorporou novos conhecimentos e recursos humanos e financeiros à ISNano. Professor do Departamento de Farmácia, ele destaca que atualmente o grupo está trabalhando na fase de registro de protótipos mais avançados de bases desenvolvidas a partir de insumos da biodiversidade brasileira junto à Anvisa.
Outro projeto aprovado no Centelha no último mês de dezembro é o InSystem: insumos farmacêuticos otimizados, que tem a frente o professor do Departamento de Farmácia Ádley Antonini Neves de Lima. Nele, os “empreendedores-cientistas” propiciam insumos tecnológicos direcionados para a área farmacêutica, cosmética e alimentícia, aliando inovação, performance e sustentabilidade ao desenvolvimento de formulações. Com 15 depósitos de patente e uma concessão registrados no INPI, Ádley defende que o empreendedorismo científico é importante porque se tem a oportunidade de transformar o que se faz nas universidades, seja projetos de pesquisa ou patentes, em produtos ou serviços e transferir tecnologias para empresas, governos e fazer com que isso chegue até as pessoas, rompendo os muros da academia e possibilitando uma interação maior com o mercado e a sociedade.
No contexto da UFRN, os empreendedores, sejam autores ou não de depósitos de patente, têm um cenário imediato de apoio na área dos ambientes promotores de inovação disponibilizada. Na instituição, há cinco incubadoras tecnológicas, o Metrópole Parque e o recém-criado Parque Científico e Tecnológico Augusto Severo (PAX), ambientes por vezes interdisciplinares, dotados de capacidade técnica, gerencial e de infraestrutura para amparar o empreendedor nascente, disponibilizando espaço apropriado e condições efetivas para proporcionar um ambiente de inovação e transformá-lo em empresas.
No ano de 2022, um importante incentivo para a disseminação da cultura do empreendedorismo nos ambientes promotores de inovação foi a aprovação da Política de Inovação. Nela consolidam-se as regras para a atuação institucional no ambiente produtivo e nos ambientes promotores de inovação. Neste último caso, por exemplo, identificam-se os espaços propícios à inovação e ao empreendedorismo em duas dimensões: ecossistemas de inovação e mecanismos de geração de empreendimentos. No documento, ficou estabelecido que o acompanhamento, apoio e promoção desses espaços são atribuições da Agência de Inovação (Agir). O diretor da Agir, Daniel de Lima Pontes, defende que os instrumentos de apoio oferecidos nesses ambientes são, por vezes, o diferencial que determina o fracasso ou sucesso de um novo empreendimento, “fato que explica a importância da oportunidade para novos empreendedores”.
Fonte: Agecom/UFRN