Sabe-se que as estrelas que observamos no céu à noite podem chegar a distâncias de milhões de anos-luz da Terra. Conhecer a distância desses astros é fundamental para entender o ciclo evolutivo das estrelas e assim compreender mais sobre o universo e suas propriedades. Nesse sentido, os aglomerados estelares, que são grupos de estrelas que se formaram na mesma época e apresentam propriedades similares, são alvo da atenção de astrônomos por proporcionarem condições ideais para estudar essas questões.
É o caso do aglomerado Westerlund 1 (WD1). Localizado na região da constelação de Ara (ou Altar), o WD1 é um aglomerado estelar jovem e provavelmente o mais massivo da Via Láctea, descoberto em 1961 pelo astrônomo suíço Bengt Westerlund. Sua distância em relação à Terra, no entanto, ainda é alvo de debates entre os cientistas, questão que ganhou novo capítulo com a publicação de um artigo em outubro de 2022, disponível na edição de dezembro da revista científica britânica Monthly Notice of the Royal Astronomical Society.
Intitulado Distance and age of the massive stellar cluster Westerlund 1. II. The eclipsing binary W36, o artigo é fruto da dissertação de mestrado de Danilo Rocha, sob orientação do professor Leonardo Almeida, da Escola de Ciências e Tecnologia da UFRN, defendida em 2019 no Programa de Pós-graduação em Física da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (PPgF/UERN). O trabalho, que teve participação crucial do professor Augusto Damineli (USP) e do astrofísico Felipe Navarete (SOAR), buscou definir a distância estimada de WD1 pelo sistema binário composto por duas estrelas massivas ligadas gravitacionalmente conhecido como W36, que integra o aglomerado.
“Devido à alta quantidade de poeira interestelar na direção de Westerlund 1, existe hoje na literatura uma grande incerteza a respeito dessas medidas e, nesse contexto, medir com precisão a distância é crucial para determinar a idade do aglomerado e, portanto, primordial para melhor entender a evolução estelar”, explica Danilo.
A escolha da binária W36 se deve ao fato de suas estrelas estarem alinhadas em relação a um observador na Terra, apresentando assim eclipses, os quais propiciam uma condição singular de observação para determinar os parâmetros fundamentais das estrelas (como massas e raios). Essa determinação foi feita com a combinação da curva de luz (fluxo em função do tempo) e a variação das linhas espectrais (curva de velocidade radial) das componentes do sistema, obtidas com as técnicas de fotometria e espectroscopia.
Para chegar aos resultados, os autores desse estudo compararam modelos teóricos de curvas de luz e de velocidade radial com os dados observados, utilizando um algoritmo computacional que gera milhares de modelos teóricos aleatoriamente, a fim de encontrar o modelo que se ajustasse melhor aos dados que possuíam. O melhor modelo forneceu parâmetros físicos e geométricos necessários para determinar a distância e a idade do sistema binário.
Assim, a distância final apresentada no artigo para o sistema W36 foi de 4,05 +/- 0,20 kpc, o que equivale a aproximadamente 13,2 mil anos-luz, resultado que se aproxima de outras medições realizadas em estudos anteriores. No entanto, a utilização de dados novos e mais precisos no artigo fez com que o nível de incerteza da medida encontrada fosse em torno de 6%, algo inédito para esse aglomerado. O resultado permitiu verificar que existiram mais de dois episódios de formação estelar em WD1, mostrando assim que o cenário de formação para esse aglomerado foi não monolítico, ou seja, quando todas as estrelas do aglomerado não são formadas em uma única época.
Além disso, os modelos teóricos de evolução estelar também puderam ser testados. De acordo com Leonardo, esses modelos apresentam dificuldades em explicar a evolução estelar a partir de dados observacionais obtidos em sistemas binários, o que indica a necessidade de mais desenvolvimento teórico dentro desse ramo da Astrofísica.
Compreender o ciclo evolutivo das estrelas massivas, ou seja, de objetos que tenham mais de oito vezes a massa do nosso Sol, é crucial para entender a formação e a evolução do universo. Elas evoluem relativamente rápido e boa parte encerra seus ciclos em explosões de supernovas, deixando como remanescentes buracos negros ou estrelas de nêutrons. Esses eventos impactam o meio interestelar e moldam a evolução de suas galáxias hospedeiras. Há ainda o fato de que elas produzem o oxigênio que respiramos e são importantes fábricas de metal no universo, enriquecendo futuras gerações de estrelas.
A distância desses corpos celestes torna-se um parâmetro fundamental porque está diretamente relacionada com a quantidade de energia emitida por elas (por exemplo, a fonte primária de energia da Terra é o Sol) e, por conseguinte, ajuda a identificar o estágio evolutivo no qual esses astros luminosos se encontram. “Conhecendo bem como as estrelas evoluem, podemos compreender melhor sobre a matéria que compõe o universo, visto que a maioria dos elementos químicos que conhecemos é sintetizada dentro dessas estrelas”, resume Leonardo.
Fonte: Agecom/UFRN