Desenvolvimento de medicamentos é um processo demorado e caro. Nesse sentido, prever as ações de um fármaco já existente pode antecipar o tratamento de uma enfermidade e diminuir tais custos. Com apoio computacional do Núcleo de Processamento de Alto Desempenho (NPAD/UFRN), foi criada uma técnica de previsão de compatibilidade entre medicamento e alvo baseada em aprendizagem profunda, o MPS2IT-DTI, que se mostrou comparável a outras abordagens de ponta.
Publicado no periódico Pharmaceutics, da editora MDPI, o estudo foi orientado pelo professor Marcelo Fernandes, do Departamento de Engenharia de Computação e Automação (DCA/UFRN), ao lado da pesquisadora Raquel de Melo Barbosa, do Departamento de Tecnologia Farmacêutica da Universidade de Granada, na Espanha. O trabalho faz parte da pesquisa do doutorando Jackson de Souza, do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica e da Computação (PPGEEC/UFRN).
Durante a pandemia da covid-19, houve extensas pesquisas em busca de medicamentos capazes de combater o vírus SARS-CoV-2, redirecionar fármacos já existentes foi uma das primeiras alternativas de contenção. Essa nova técnica acelera os testes in silico, ou seja, a primeira etapa no desenvolvimento de novos medicamentos, só então são feitos os testes in vitro, realizada em laboratórios, e, por fim, os testes in vivo, feitos com animais e seres humanos como fase final, pelos quais se avalia a segurança e a eficácia da substância. Assim como um funil, a técnica delimita melhor quais fármacos têm potencial contra a doença em questão, diminuindo a quantidade de candidatos para verificação.
Nos últimos anos, técnicas de aprendizagem de máquina têm sido bastante utilizadas na indústria farmacêutica. A grande inovação desta pesquisa é a utilização da aprendizagem profunda (deep learning) e a exibição em imagens das moléculas que representam os medicamentos e seus alvos. Com esse método, a técnica precisa ser treinada com milhares de dados de imagens e, então, é capaz de entender e prever as relações entre a molécula e as sequências de aminoácidos de proteínas-alvo.
Para alcançar resultados mais precisos, os pesquisadores decidiram utilizar uma rede neural artificial profunda aplicada à classificação de imagens. “Técnicas de Deep Learning, principalmente a CNN (convolutional neural network) vêm tendo sucesso no reconhecimento de imagem”, explica o professor Marcelo Fernandes. “Nesse estudo, escolhemos fármacos e proteínas-alvo, em seguida transformamos essa informação em imagens. Assim criamos uma impressão digital de cada um deles”, complementa.
Após a criação das imagens, a técnica de Deep Learning é treinada com vários valores conhecidos de interação entre medicamentos e proteínas-alvo. Em seguida, o algoritmo aprende a prever novas interações. “A partir do momento em que você descobre que fármacos comerciais, de prateleira, podem ser usados em outras enfermidades, você reduz custos, isso pode ter um alcance social imenso”, afirma o professor.
Criar uma técnica como essa exige um grande esforço computacional. A quantidade de dados necessários para alimentar a aprendizagem profunda é massiva e custosa para ser processada em computadores comuns. Por isso foi necessária a utilização do supercomputador do NPAD para o desenvolvimento do MPS2IT-DTI. “O importante no desenvolvimento da técnica de Deep Learning no NPAD é que podemos transferir o esforço computacional de qualquer lugar para o supercomputador. O doutorando Jackson realizou toda a parte experimental morando no Tocantins. Dessa forma, sem o NPAD, isso seria muito difícil”, comenta o professor Marcelo.
A análise de dados genômicos virais com Inteligência Artificial é o alvo de pesquisas do grupo AI-Genomics, coordenado pelo professor Marcelo Fernandes, que atua nessa área desde 2018. Antes da pandemia, a quantidade de informações genéticas para pesquisas com aprendizagem de máquina era pequena, logo após, foi observada uma alta disponibilidade de dados genômicos do SARS-CoV-2, permitindo novas possibilidades de trabalhos. “Começamos o trabalho com algo em mente, vamos tentar estudar quais são os fármacos que podem ser usados contra o SARS-CoV-2, essa foi a nossa grande motivação, mas, a partir disso, o trabalho pode ser aplicado a outros vírus e outras enfermidades”, esclarece.
Atualmente, além do combate à covid-19, a técnica está sendo usada em outro trabalho relacionado à redução de nascimentos prematuros. “Escolhemos também o tema da prematuridade, devido a ser uma das principais causas de mortalidade infantil no mundo e não existirem muitos fármacos comerciais para esse problema, então vamos procurar algum já conhecido que possa ser usado”, informa o pesquisador.
Fonte: Agecom/UFRN