Caçador do Espaço: novo instrumento da UFRN busca planetas no Infravermelho

A pesquisa astronômica desenvolvida na UFRN conta com mais um reforço. A Universidade nordestina ㅡ que tem se destacado por desenvolver atividades em Astronomia Observacional, com ênfase em instrumentação, espectroscopia, evolução estelar e exoplanetologia ㅡ agora tem a disposição um instrumento de ponta chamado NIRPS (acrônimo do inglês para Near InfraRed Planet Searcher), ou “caçador de planetas no infravermelho”. Esse equipamento  é capaz de impulsionar a tão aguardada descoberta por planetas habitáveis próximo ao nosso sistema solar.

Desenvolvido por um consórcio internacional constituído pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidades de Montreal, Genebra, Grenoble, Porto e o Instituto de Astrofísica de Canárias, o instrumento foi recentemente instalado no telescópio de 3,60 m do European Southern Observatory (ESO), no Observatório de La Silla, no Chile. Após os testes iniciais, o NIRPS completou com sucesso as primeiras observações do espaço.

NIRPS e o seu sistema de óptica adaptativa – Foto: N. Blind (Observatoire de Genève)/consórcio NIRPS/ESO

O NIRPS tem um sistema de óptica adaptativa, pela qual a luz do telescópio é direcionada através de um série de espelhos antes de ser injetada em uma fibra óptica (figura 1). Graças a este sistema, os distúrbios da atmosfera terrestre podem ser corrigidos, permitindo observações mais nítidas.

Foi na UFRN, em 2014, que pesquisadores do ESO e da UFRN deram partida ao projeto, definindo as principais características técnicas e produzindo o primeiro desenho óptico do instrumento. Após esses passos iniciais foi constituída uma equipe internacional, conduzida pelo cientista potiguar Cláudio Melo, naquele momento um dos diretores do ESO, com o propósito de materializar a ideia. A construção do NIRPS teve seu início em 2017, contando com a participação efetiva dos cientistas Bruno Leonardo Canto Martins, Izan de Castro Leão e Allan de Medeiros Martins, além dos doutorandos Márcio Teixeira e Yuri Messias, todos da UFRN.

Primeiros dados brutos do instrumento NIRPS: o espectro da estrela Barnard. Cada linha horizontal corresponde a uma região estreita de luz onde tanto as linhas de absorção da estrela quanto a absorção da atmosfera da Terra são visíveis. As linhas pontilhadas correspondem ao chamado espectro comb, uma espécie de régua que é usada como referência para as linhas horizontais, para que os cientistas possam saber a quais comprimentos de onda de luz elas correspondem – Foto: Consórcio ESO/NIRPS

O astrônomo José Renan de Medeiros, do Departamento de Física Teórica e Experimental da UFRN, co-investigador do NIRPS, fala sobre a dimensão do desafio. “O NIRPS representou um desafio particular em todas as etapas, que se traduz hoje em uma grande satisfação para todos nós, por termos visto suas primeiras sementes aqui no Campus da UFRN e agora sua primeira luz, em um pico no Atacama. Mais ainda, por estarmos contribuindo para colocar a UFRN, definitivamente, no círculo especial da Exoplanetologia e no campo da instrumentação astronômica, que representam áreas de fronteira do conhecimento”, ressalta José Renan.

O co-investigador principal do NIRPS, René Doyon, diz estar empolgado com as possibilidades e acredita que o aparelho poderá ajudar a encontrar mundos habitáveis mais próximos do nosso Sistema Solar. “O NIRPS está em construção há muito tempo e estou entusiasmado com a forma como esta missão se concretizou”, diz René, que é diretor do Observatoire du Mont-Mégantic e do Instituto de Pesquisa em Exoplanetas, em  Montreal.

Velocidade Radial

Câmara criogênica cilíndrica dentro da qual as peças ópticas do instrumento estão instaladas – Foto: F. Bouchy (Observatoire de Genève)/consórcio NIRPS/ESO

O instrumento foca sua busca em mundos rochosos, que são alvos-chave para entender como os planetas se formam e evoluem, e onde, ressalta José Renan, seria mais provável da vida se desenvolver. O NIRPS irá procurar por esses exoplanetas rochosos em torno de pequenas estrelas anãs vermelhas frias, o tipo mais comum de estrelas na Via Láctea, que possuem massas de duas a dez vezes menores que o nosso Sol.

Os exoplanetas serão procurados usando o método de velocidade radial: à medida que um planeta orbita uma estrela, sua atração gravitacional faz com que a estrela oscile levemente, fazendo com que sua luz seja desviada para o vermelho ou azul à medida que se afasta ou se aproxima da Terra. Ao medir as mudanças sutis na luz da estrela, o NIRPS ajudará os astrônomos a medir a massa do planeta, bem como outras propriedades.

O NIRPS buscará essas oscilações espectrais usando luz infravermelha próxima, por ser a principal faixa de comprimentos de onda emitidos por estrelas pequenas e frias. O equipamento se junta ao High Accuracy Radial Velocity Planet Searcher (HARPS) na busca por novos mundos rochosos. O HARPS, instalado no telescópio de 3,6m do ESO, no Observatório de La Silla/Chile, desde 2003, também usa o método da velocidade radial, mas funciona com luz visível. Usar os dois instrumentos simultaneamente fornecerá uma análise mais abrangente desses mundos rochosos.

NIRPS, juntamente com o seu sistema de ótica adaptativa, está localizado logo abaixo do espelho primário do telescópio de 3,6 metros do ESO – Foto: F. Bouchy (Observatoire de Genève)/NIRPS consortium/ESO

Outra diferença fundamental entre os dois instrumentos é que o NIRPS contará com um poderoso sistema de óptica adaptativa. Esta técnica corrige os efeitos da turbulência atmosférica, que faz com que as estrelas brilhem. Ao usá-la, o “caçador de planetas” mais do que dobrará sua eficiência em encontrar e estudar exoplanetas. “O NIRPS se junta a um número muito pequeno de espectrógrafos no infravermelho próximo de alto desempenho e espera-se que seja um ator-chave para observações em sinergia com missões espaciais como o telescópio espacial James Webb e observatórios terrestres”, acrescenta François Bouchy, da Universidade de Genebra, na Suíça, e também co-investigador desse instrumento.

As descobertas feitas com o NIRPS e o HARPS serão seguidas por alguns dos observatórios mais poderosos do mundo, como o Very Large Telescope do ESO e o próximo Extremely Large Telescope, no Chile, para o qual instrumentos semelhantes estão em desenvolvimento. Ao trabalhar em conjunto com observatórios espaciais e terrestres, o novo equipamento poderá reunir pistas sobre a composição de um exoplaneta e até mesmo procurar sinais de vida em sua atmosfera.

Para poder operar no infravermelho, o instrumento NIRPS precisa ser mantido a temperaturas extremamente baixas, para evitar que o calor interfira nas observações. A câmara criogênica cilíndrica dentro da qual as peças ópticas do instrumento estão instaladas mantém os componentes em um ambiente de vácuo e resfriado a -190 graus Celsius.

Alguns membros da pesquisa, como cientistas, engenheiros e estudantes, têm trabalhado na montanha chilena de La Silla, durante o período de instalação, testes e comissionamento do instrumento. A equipe tem um tempo garantido de telescópio de 720 noites durante os primeiros cinco anos de operação, quando poderão utilizar o sistema para seus projetos de busca e estudo de planetas.

Colaboração

Telescópio de 3,6 metros do ESO, no Observatório de La Silla no Chile, abriga um dos instrumentos caçadores de planetas mais bem sucedidos do mundo: o High Accuracy Radial velocity Planet Searcher (HARPS). O NIRPS, que também está instalado junto a esse telescópio, se junta ao HARPS na procura de exoplanetas, com foco em mundos rochosos que orbitam estrelas anãs vermelhas – Foto: Zdeněk Bardon (bardon.cz)/ESO

O NIRPS foi construído por uma ampla colaboração internacional, constituída por diversos laboratórios da UFRN, Universidades de Montreal, Laval, Genebra, Grenoble, Porto e Instituto de Astrofísica de Canárias. No Rio Grande do Norte, as ações para o desenvolvimento e construção do equipamento foram realizadas no Núcleo de Astronomia Observacional e Instrumental, do Departamento de Física, e no Laboratório de Automação, Controle e Instrumentação, do Departamento de Engenharia Elétrica.

Pelo lado brasileiro, as observações, o tratamento e a análise dos dados serão conduzidas pelo Laboratório Internacional para a busca de Exoplanetas no Infravermelho/NIRPS, instalado no Departamento de Física da UFRN. A participação da UFRN neste projeto foi financiada parcialmente pela CAPES, através do programa PRINT, e pelo CNPq.

Fonte: Agecom/UFRN

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