A Organização Mundial da Saúde (OMS) começou 2022 estabelecendo uma nova classificação para a Síndrome de Burnout, o esgotamento físico e mental associado às atividades corporativas. A entidade oficializou a síndrome como uma doença ocupacional, ou seja, a reconhece como um fenômeno ligado essencialmente ao trabalho. Na prática, isso aumenta a responsabilidade direta e indireta das empresas com relação à saúde de seus colaboradores. O fato deve tornar empregados e empregadores mais atentos aos sinais, e também para pensar formas mais saudáveis de viverem o cotidiano de trabalho.
O Brasil é o segundo país com o maior número de trabalhadores afetados pelo Burnout, segundo a International Stress Management Association (ISMA-BR). “O movimento de tornar o trabalho algo significante na causa da doença não pode ser exclusiva do trabalhador, pois ele não domina todos os aspectos da cadeia produtiva”, ressalta o psicólogo Cásio Barreto. Segundo ele, é quando o problema se apresenta que as empresas podem e devem criar condições que favoreçam a relação indivíduo-trabalho, e ela seja enxergada como uma verdadeira parceria.
A percepção do trabalho como algo mais opressivo do que prazeroso é algo que costuma favorecer o aparecimento do Burnout, segundo o psicólogo. “Há muito tempo deixamos de ver o trabalho como fonte de gratificação, para se tornar algo como um ‘mal necessário’. Aquela coisa ruim que somos obrigados a exercer para poder obter outras conquistas materiais. Quando deixamos de enxergar satisfação e perceber o trabalho como origem de sofrimento, a porta para o Burnout vai se abrindo”, explica.
Exaustão
A sensação de que o dia nunca tem horas suficientes é um forte indício de que a rotina do trabalhador pode estar sendo afetada pela síndrome. O aumento brusco de produtividade é considerado o sinal inicial da doença. Em seguida vem a taquicardia, a falta de ar, dores musculares, dor de cabeça ou insônia, juntamente com mudanças na alimentação. O auge é a exaustão total.
“Há desânimo, esgotamento físico e mental, alterações no padrão do sono (para mais ou para menos), a irritabilidade, perda de apetite ou ganho de peso por adotar uma dieta desequilibrada, distúrbios gastrointestinais, como azia, a síndrome do intestino irritável, os esquecimentos, dores de cabeça sem causa orgânica, desorganização do tempo”, lista Cásio, ressaltando que tudo isso vem num processo gradual, e assinala que é preciso repensar a rotina de vida.
Entre as características mais evidentes do transtorno estão o pessimismo, a baixa autoestima e as mudanças bruscas de humor. Muitas vezes, essa condição pode ser confundida com o estresse, sendo importante entender que se trata de uma doença mais grave. Daí a importância da ajuda terapêutica psicológica quando se faz necessário.
Cássio ressalta a Terapia Cognitivo-comportamental (TCC), uma abordagem considerada breve, com um forte enfoque no aqui-agora e na resolução dos conflitos, através da elaboração das melhores estratégias. “Permite que as metas definidas entre o terapeuta e o paciente sejam alcançadas, de modo a serem mais assertivas em suas decisões diárias”, explica. Apesar da mudança, a síndrome de Burnout continua sendo considerada um problema na saúde mental e um quadro psiquiátrico.
A pandemia fez muita gente levar o trabalho para casa, o que não significou relaxamento e conforto para todos os trabalhadores. Cásio explica que o home office chegou com muito atraso em muitas partes do mundo – Brasil incluso. Para complicar, chegou mais como uma imposição do que uma solução, tornando-se fonte de estresse para muitos.
“As pessoas, além de não terem mais horários definidos de início e fim do expediente, ainda tiveram que conciliar no mesmo ambiente os cônjuges, os filhos e a visão de sua cama ‘chamando’ para deitar o tempo todo”, explica.
Como tudo é uma questão de adaptação, para uma parte significativa da população o trabalho onine acabou revelando o que estava há tempos escondido debaixo do pano da normalidade. “Por isso, é plausível afirmar que a pandemia não só revelou como intensificou alguns quadros psicológicos e psiquiátricos que em outros tempos poderiam nem serem sequer notados”, analisa.
Cuidados
No momento em que a Síndrome de Burnout afeta o trabalhador, a empresa também sente. O transtorno costuma se desenvolver gradualmente, de acordo com mudanças que ocorrem no ambiente de trabalho e situações que provocam o esgotamento físico e mental. Por isso é importante que as empresas analisem e mantenham seu próprio ambiente o mais amigável e humano possível, valorizando os cuidados com a saúde mental dos colaboradores e transformando a experiência deles como parte integrante do sucesso da companhia.
A parceria entre empresa e trabalhador, já assinalada por Cásio Barreto, pode consistir em proporcionar um ambiente aconchegante, um salário justo, tarefas desafiadoras, mas não extenuantes, que valorizem as ideias e as experiências de seus colaboradores. “isso faz com que o corpo técnico se sinta importante no processo, se envolvendo cada vez mais”, ressalta o psicólogo.
A intensificação do sentimento negativo em relação ao trabalho é listado pela própria OMS como uma das característica do Burnout, algo que as empresas devem pensar em reverter em suas iniciativas de combate à síndrome. É importante que a saúde emocional passe a ser cada vez mais debatida no meio corporativo, fazendo com que as empresas compreendam que os cuidados mentais não devem mais ser entendidos como um benefício extra, mas sim como uma responsabilidade delas.
Segundo Cásio, as pessoas também podem lançar mão de algumas iniciativas pessoais para evitar o burnout. “Acredito que a velha receita de uma dieta equilibrada, boas noites de sono, atividade física regular, uma boa roda de conversa com pessoas reais, e momentos de puro ócio são os ingredientes suficientes para uma vida tranquila e prazerosa. Algo que nossos avós já sabiam”, conclui.
Crédito da Foto: Adriano Abreu
Fonte: TRIBUNA DO NORTE