Tubos e dutos diferenciados

Usar um material-base como o poliéster, acoplar uma fibra de carbono, inserir um material ligante e “rechear” com partículas minúsculas que possuam propriedades ferrimagnéticas resultou em um produto inovador para a indústria petrolífera desenvolvido por cientistas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), com ineditismo reconhecido pelo Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) no mês de novembro.

O material tem a função de identificar defeitos estruturais a partir do uso de partículas com propriedades magnéticas em matrizes poliméricas. Essa funcionalidade acontece a partir da presença da ferrita no produto. Assim, quando existir um defeito estrutural, como trincas, fissuras e bolhas que gerem algum tipo de heterogeneidade estrutural, no teste é dado um “alerta” a partir da identificação de um campo magnético resultante da imperfeição.

Esse campo magnético passa a existir em decorrência dos defeitos. No caso de uma fissura, por exemplo, ocorre um escape de magnetismo, o que tecnicamente se denomina efeito de vazamento de fluxo magnético. A partir daí, com um detector ou sensor de campo, é possível identificar o tipo de defeito, determinar seu tamanho e a sua localização, pois o material patenteado pelos pesquisadores possui, como diferencial, marcadores magnéticos responsáveis por identificar variação na intensidade do campo magnético. Sobre campos magnéticos, lembremos de imãs, materiais constituídos de substâncias ferromagnéticas que repelem ou exercem atração ao seu redor a partir de campos magnéticos.

A concessão da invenção recebeu o nome de material com adição de marcadores magnéticos para avaliação não destrutiva de integridade e seu método de fabricação e aplicação – Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN

A possibilidade de identificação é hoje possível em tubulações de ferro, mas inédita em materiais poliméricos — que apresentam características diferenciadas, como menor peso e resistência à corrosão. A conjunção desses fatores explica a razão pela qual uma das potenciais aplicações do produto patenteado é na fabricação de tubos para a indústria de exploração de óleo, gás e derivados, setor que utiliza um grande complexo de dutos metálicos para realização de suas operações em terra e em mar, tubos por meio dos quais petróleo, gás natural, os fluidos de processo e derivados são deslocados.

“Ao se adicionar marcadores magnéticos em matrizes poliméricas, torna-se possível a avaliação da integridade do material mediante o uso de equipamentos que utilizam sensores magnéticos para identificar a presença de danos ou de falhas. Assim, permite a inspeção desses materiais utilizando técnicas de ensaios não destrutivos que são sensíveis às alterações de campo magnético”, explica Ana Paula Pereira Fulco.

O estudo que deu origem ao invento foi idealizado por uma equipe multidisciplinar, que participou desde a construção da solução até o aparato de testes utilizado e a própria discussão e análises dos dados. Compõem a equipe engenheiros e físicos atuantes em diversos locais, como o Laboratório de Síntese de Materiais em Pó e Bulk do Departamento de Física da UFRN e o Laboratório de Calorimetria, Transporte e Magnetometria do Departamento de Física da UFPE.

Ana Paula Pereira faz parte da equipe multidisciplinar responsável pelo invento – Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN

Assim, ao lado de Alexandre Ricalde Rodrigues, Carlos Alberto Paskocimas, Fernando Luis de Araujo Machado, José Daniel Diniz Melo e Suzana Nobrega de Medeiros, Ana Paula forma o grupo de pesquisadores responsável pelo desenvolvimento do novo produto, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais (PPGCEM) e cujos titulares são a UFRN e a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Desenvolvimento do produto

O grupo relata que o estágio de desenvolvimento da tecnologia está no nível de pesquisa e projeto, com estudo em laboratório realizado para avaliação de viabilidade envolvendo um modelo para prova de conceito, já construído e testado. Eles identificam que, dentro do contexto de criação de novos produtos, as patentes são importantes para proteger a propriedade intelectual, seja uma invenção ou modelo de utilidade. “Assim, o reconhecimento e a proteção da propriedade intelectual incentivam o inventor a prosseguir com suas pesquisas, trazendo benefícios diretos à sociedade. A transferência de tecnologia para o setor produtivo é também uma etapa de fundamental importância, para que o invento possa se transformar em produto a ser disponibilizado à sociedade”, pontua o professor Carlos Alberto Paskocimas.

A confecção do novo material começa com dispersão das partículas de ferritas de bário ou de ferrita de estrôncio em uma resina de poliéster ortoftálica – material de baixo custo e de excelente compatibilidade com fibras de vidro. Com um agitador mecânico, é feita a mistura para alcançar a homogeneização da resina de poliéster com as partículas de ferrita. O resultado é uma resina de poliéster aditivada com partículas ferrimagnéticas. Em seguida, são acrescentados os agentes catalisadores e aceleradores de cura.

De acordo com a pesquisadora, a resina de poliéster é o local em que as partículas de ferrita de bário se dispersam – Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN

Subsequente a essas etapas, passa-se à confecção da peça. Aqui, mantas de vidro são estendidas, misturadas com a resina de poliéster aditivada sobre a superfície de um molde com formato de disco, em camadas alternadas. Desta forma, as camadas individuais que compõem o referido disco são sucessivamente construídas, uma posterior a outra, em uma placa plana formada por uma manta de fibra de vidro e por fibras de vidro impregnadas com a resina de poliéster aditivada com as partículas de ferrita. Rolos de compactação ajudam na remoção de bolhas e na melhor compactação entre as sucessivas camadas. A confecção do disco é concluída após a deposição de 15 camadas. Depois de completado o processo de cura da resina polimérica, momento em que ela endurece e adquire consistência, a peça é desmoldada.

“Preparamos amostras para ambos os compósitos, no caso um com adição de ferrita de bário e o outro com adição de ferrita de estrôncio, com a obtenção de detalhes microestruturais, pois era um passo essencial para o arranjo experimental utilizado para demonstrar o funcionamento do referido invento e, óbvio, para a realização do método não destrutivo de detecção e medição dos defeitos. Os resultados demonstram que a adição de partículas ferrimagnéticas ou, alternativamente, de partículas ferromagnéticas viabiliza o uso de técnicas de inspeção magnética para realização da inspeção de danos ou detecção de defeitos em peças ou estruturas à base de polímeros ou de compósitos de matriz polimérica”, explica Ana Fulco.

Depositado em 2012, o produto patenteado é resultado do trabalho de graduação de Ana Fulco na UFRN, em Engenharia de Materiais. Em 2011, a pesquisa ganhou a 5ª edição do Prêmio Petrobras de Tecnologia e, seis anos após, resultou na publicação de um artigo internacional sobre o mesmo tema, derivado da sua pesquisa de mestrado.

Fonte: AGECOM/UFRN

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