Cientistas da colaboração internacional LIGO-Virgo-KAGRA anunciaram, no dia 29 de junho, a primeira detecção de um evento astronômico de proporções épicas: a colisão de um buraco negro com uma estrela de nêutrons. “Com essa nova descoberta de fusões de buracos negros de nêutrons fora de nossa galáxia, descobrimos o tipo de binário que faltava. Podemos finalmente começar a entender quantos desses sistemas existem, com que frequência eles se fundem e por que ainda não tínhamos visto exemplos como esse na Via Láctea”, afirma Astrid Lamberts, pesquisadora da colaboração Virgo no laboratório Artemis e Lagrange (Nice, Itália).
A colaboração LIGO-Virgo-KAGRA, que conta com laboratórios de detecção localizados entre EUA, Itália e Japão e com a participação de centros de pesquisa de todo o planeta, detectou a primeira onda gravitacional gerada pela colisão de um buraco negro e uma estrela de nêutrons em 5 de janeiro deste ano e, dez dias depois, a segunda. Os laboratórios envolvidos detectam, na Terra, eventos de proporções cataclísmicas a partir das ondulações que resultam de colisões de objetos astronômicos.
Membro da colaboração LIGO-Virgo no Brasil, o professor Riccardo Sturani, pesquisador do Instituto Internacional de Física da UFRN, explica que essa era uma detecção esperada pelos pesquisadores, mas que o fato histórico está na primeira detecção de uma colisão desse sistema binário misto. De acordo com o físico, estrelas de nêutrons são objetos estranhos, que possuem uma massa entre uma e até três vezes maior que a do Sol, mas que estão contidos em apenas 10 km de extensão. Por isso, eles sempre atraíram a atenção de cientistas, em especial sobre a sua relação com buracos negros. “Desde 2015, quando fizemos as primeiras detecções já prevíamos esses resultados. A surpresa seria a de não o encontrarmos. Esse sistema era esperado, o grande acontecimento é que nunca observamos um sistema misto com um buraco negro e uma estrela de nêutrons”, disse.
O primeiro evento (GW200105) foi observado pelos detectores LIGO Livingston e Virgo. Ele produziu um sinal forte no detector LIGO, mas teve um pequeno sinal-ruído no detector Virgo. O outro detector LIGO, localizado em Hanford, Washington, estava temporariamente desligado. Dada a natureza das ondas gravitacionais, a equipe inferiu que o sinal era causado por um buraco negro colidindo com um objeto compacto, que possuía massa solar de 1,9 e mais tarde identificado como uma Estrela de Nêutrons. Esta fusão viajou 900 milhões de anos-luz até chegar na Terra.
O segundo evento (GW200115) foi observado pelos detectores LIGO e Virgo no dia 15 de janeiro e levou a equipe de pesquisadores a concluir que se tratava da fusão de um buraco negro com uma estrela de nêutrons de massa solar de 1,5, localizada a 1 bilhão de anos-luz do nosso planeta, distância medida com base na forma de onda detectada. Como o sinal era forte em apenas um detector, a localização da fusão no céu permanece incerta, encontrando-se em algum lugar em uma área que é 34.000 vezes o tamanho de uma lua cheia.
A partir da segunda detecção, a possibilidade de se tratar de um sistema composto por um buraco negro e uma estrela de nêutrons começou a se tornar mais real, uma vez que foi possível confirmar que os primeiros sinais não eram uma falha de equipamento ou de interpretação.
Para formar ondas gravitacionais detectáveis, os objetos que se aglutinam devem ser extremamente densos, com identidades que podem ser fixadas por suas massas. Qualquer coisa com uma massa acima de cinco massas solares só poderia ser um buraco negro e qualquer coisa menor que cerca de três massas solares deve ser uma estrela de nêutrons.
Cientistas agora podem afirmar que esses eventos são razoavelmente comuns, acontecendo regularmente em todo o Universo, mas ainda não se sabe como esses sistemas se encontram. Eles poderiam surgir a partir de objetos criados separadamente e que se encontram em aglomerados de estrelas e buracos negros ou ainda que tenham aparecido a partir de estrelas que orbitam uma a outra, com uma colapsando em um buraco negro e a outra formando uma estrela de nêutrons após esgotarem seus combustíveis.
Os detectores estão agora em um período de reparos e melhoramentos para voltarem à atividade no segundo semestre de 2022.
Imagem: IIF/UFRN
Fonte: Agecom/UFRN