Sem auxílio emergencial, renda de famílias no RN despenca

Charlene Baracho, de 37 anos, viu sua renda encolher com o fim do auxílio emergencial. Ela está entre os potiguares que voltaram a viver com menos de R$ 178 no mês - Foto: Magnus Nascimento

De uma hora para a outra a dona de casa Charlene Baracho, 37 anos, viu sua renda encolher com o fim do auxílio emergencial concedido pelo Governo Federal durante a pandemia do novo coronavírus. Ela está entre os potiguares em situação de pobreza, cuja família voltou a viver com uma renda média mensal per capita menor que R$ 178. Mesmo com a possível renovação do benefício, previsto para ficar em R$ 250, a situação permanece preocupante, visto o aumento no preço dos alimentos.

A Fundação Getúlio Vargas apontou em maio passado que o auxílio emergencial evitou a inclusão de 121,6 mil famílias potiguares na situação de extrema pobreza no início da pandemia do novo coronavírus. Sem a renovação do auxílio emergencial, estima-se que 314 mil pessoas no Rio Grande do Norte estão sobrevivendo com uma renda per capita de R$ 7,60 o preço de 1 kg de feijão, segundo a última pesquisa Pnad/Covid, divulgada no final do ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com o benefício, esse contingente possuía renda per capita de R$ 156, superior 20 vezes. Conforme dados do instituto, em novembro de 2020 cerca de 52,8% dos domicílios do RN receberam auxílio emergencial. Eram aproximadamente 600 mil famílias recebendo o benefício no Estado com valores que variavam, inicialmente de R$ 600 a R$ 1200 reais, e depois de R$ 300 a R$ 600 reais.

Charlene, personagem que abre esta reportagem, mora em um dos barracos da Ocupação Olga Benário, na zona Oeste de Natal. As ocupações são os locais onde a pobreza e a miséria se mostram extremamente evidentes, devido à falta de estrutura básica das famílias viverem. Mas durante a pandemia do novo coronavírus, a situação financeira foi um pouco melhor do que a dona de casa estava habituada.

Beneficiária do Bolsa família, ela fazia serviços informais como faxineira e seu esposo trabalhava com os chamados “bicos”, serviços informais, de conserto de móveis, por exemplo, para sustentar os três filhos. A renda mensal da família, antes do auxílio, girava em torno dos R$ 600. Como a pandemia impediu que o casal fizesse seus “bicos”, o auxílio emergencial de R$ 1.200 trouxe um alívio para as contas.

“Não era suficiente pra gente ter nossa casa, comprar móveis, nem nada. Mas dava pra gente almoçar, sabendo que mais tarde teria janta sem a gente se arriscar fazendo bicos e correndo risco de pegar covid”, contou a moradora. Ela disse que, para quem luta diariamente contra a fome, a prioridade sobre qualquer recurso que chega é garantir a comida.

No ano passado, a renda per capita (valor mensal por pessoa da família) no barraco de Charlene ficou em R$ 240. Mas 2020 acabou e com ele o dinheiro para ajudar a sobreviver na pandemia. Com isso, a renda per capita voltou aos patamares de antes. A família está sobrevivendo com os R$ 260 oriundos do Bolsa Família e cerca de R$ 350 que o marido arrecada como catador de materiais recicláveis. “Estamos em situação mais difícil do que antes do auxílio. A gente só come o básico, o que dá pra comprar e temos dificuldade de ganhar dinheiro de outra forma”, disse a dona de casa.

Preço dos alimentos agrava situação dos mais pobres

A situação depois de um ano de pandemia ainda é pior devido a disparada no preço dos alimentos e de produtos de primeira necessidade, como o gás de cozinha, por exemplo. É arriscado para quem mora em barracos cozinhar em fogo à lenha ou carvão por causa da quantidade de materiais inflamáveis. Por isso, os moradores se sentem obrigados a utilizarem o gás.

O botijão de 13kg iniciou 2020 com o preço na faixa dos R$ 70. Atualmente, passa dos R$ 90, dependendo do local da compra. Já a cesta básica subiu 19,55% em Natal durante o ano de 2020, segundo Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos, divulgada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), que identificou alta em quase todos os alimentos que compõem a cesta.

Maria Gabrielle, de 19 anos, de máscara rosa, diz que virou pedinte nas ruas, após fim do auxílio, para conseguir comprar leite para os filhos, de 2 e 3 anos – Foto: Magnus Nascimento

Ao ver a renda alcançada com o auxílio emergencial ruir, sem emprego e contando apenas com R$ 180 do Bolsa Família, Maria Gabrielle Gomes, 19 anos, diz que virou pedinte nas ruas. A filha de 2 anos de idade e o filho de 3 precisam de leite, um dos produtos que registrou alta no preço em 2020. “Se eu pego R$ 100, é pra massa e o leite que tá ainda mais caro do que antes da pandemia. Com o auxílio, dava para manter a família de forma melhor. Com o que tem agora não dá. A gente está indo pra rua pedir porque a gente não acha emprego e só o Bolsa Família não dá”, contou a jovem, que largou os estudos na 6ª série quando engravidou.

Com os dois filhos, ela vive em situação de extrema pobreza com renda mensal per capita menor que R$ 89 num barraco em outra ocupação, a Helleny Ferreira, na zona Norte da capital. No ano passado, com o fim do auxílio emergencial, Gabrielle e sua mãe, Isabel Cristina, 40 anos, contaram à TRIBUNA DO NORTE sobre a preocupante expectativa de retornar à situação de extrema pobreza na qual viviam antes da pandemia. Agora, confirmaram que o que temiam está acontecendo.

Dona Isabel mora no mesmo assentamento com o esposo, que recebe o Bolsa Família no valor de R$ 80. Eles precisam catar materiais recicláveis nas ruas ou realizar fretes na carroça para aumentar a renda. “Mas estamos com o pneu da carroça furado e falta dinheiro até para consertar”, relatou. Além disso, eles dizem que a reciclagem não está rendendo como antes, por reflexo da pandemia. “O fim do auxílio trouxe prejuízo porque a gente conseguia viver numa situação melhor. Agora, a gente tem que se virar como pode e por isso voltamos a catar nas ruas”, disse a catadora.

Créditos: Magnus Nascimento

Fonte: TRIBUNA DO NORTE

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