Conversar em ambientes fechados pode espalhar mais vírus do que tossir, segundo um novo estudo publicado no periódico Proceedings of the Royal Society A. A pesquisa também ressalta que, além do distanciamento social, o uso de máscaras de boa qualidade e a ventilação dos ambientes são medidas essenciais para evitar a transmissão do coronavírus.
Liderados pelo brasileiro Pedro Magalhães de Oliveira, cientistas da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, criaram um modelo matemático para entender como a covid-19 se espalha em ambientes fechados dependendo de diferentes condições: tamanho do espaço, número de pessoas presentes, se elas usam máscaras e se o local é ventilado ou não.
Sabe-se que o coronavírus pode ser transmitido de duas maneiras: uma é pelo contato direto com gotículas de saliva que saem da boca e do nariz do infectado ao falar, tossir ou espirrar. Essas gotículas, apesar de pequenas, são pesadas e se acumulam em superfícies. Logo, o segundo jeito de contrair o vírus é tocar nessas superfícies contaminadas e levar a mão ao rosto sem antes higienizá-la. Por isso é importante utilizar álcool em gel e lavar as mãos constantemente, para eliminar o contato com essas amostras infectadas. Já a máscara e o distanciamento social servem para evitar contato direto com as gotículas expelidas pelo infectado.
Evidências crescentes em 2020 levaram cientistas a reconhecer que a Covid-19 também se transmite de uma forma ainda mais sutil: através de aerossóis, partículas muito pequenas que flutuam no ar e se espalham pelo ambiente, sem que você esteja necessariamente de frente para o infectado.
Não se sabe o quão comum esse tipo de transmissão é no dia a dia; segundo o Centro de Controle e Doenças dos Estados Unidos, a via de aerossóis não parece ser a principal forma de contágio. “Se o SARS-CoV-2 se espalhasse principalmente através da transmissão por aerossóis (como o sarampo) os especialistas teriam observado uma disseminação global consideravelmente mais rápida da infecção no início de 2020, além de porcentagens mais altas de infecção medidas por pesquisas sorológicas”, diz o CDC. No entanto, os especialistas reconhecem que esse tipo de transmissão pode acontecer em ambientes fechados e mal ventilados.
No novo estudo, os cientistas descobriram que, em uma sala fechada com duas pessoas que não estão usando máscaras, o ato de falar espalha mais partículas do tipo aerossol do que tossir – esse, por sua vez, gera um número maior de gotículas pesadas. Os aerossóis viajam rapidamente para mais de dois metros da pessoa infectada – mostrando que apenas o distanciamento social, por si só, não é uma proteção garantida.
Um dos cenários projetados comparou os efeitos uma tosse e uma conversa de 30 segundos com uma pessoa infectada. Numa tosse curta, o número de partículas infecciosas no ar cai rapidamente após um intervalo de 1 a 7 minutos. Falar por 30 segundos, porém, gerava mais partículas, que demoravam meia hora para atingir os índices baixos medidos no caso da tosse. Ou seja: haveria mais partículas com vírus no ar após a fala do que após a tosse.
No entanto, tanto o uso de máscaras quanto a ventilação adequada do ambiente reduziram os números consideravelmente. Enquanto a proteção facial pode filtrar parte das partículas infectadas que uma pessoa emite, a ventilação constante ajuda a eliminar essas partículas do ambiente e renovar o ar respirado pelas pessoas.
Com base nesses dados, a equipe também criou uma ferramenta online e aberta, chamada Airborne.cam, que ajuda a simular como a transmissão se dá em um ambiente fechado e como minimizar os riscos. É possível incluir o tamanho do ambiente, ocupação e ventilação para simular os riscos de contrair a doença. Segundo os pesquisadores, o site pode ser utilizado por gestores de ambientes como lojas, restaurantes e instituições de ensino. A ferramenta já está sendo aplicada nas salas e prédios de vários departamentos da Universidade de Cambridge, segundo revelaram os autores em um comunicado.
“Nosso conhecimento sobre a transmissão aérea do SARS-CoV-2 evoluiu a um ritmo incrível, considerando que se passou apenas um ano desde que o vírus foi identificado”, disse o brasileiro Pedro de Oliveira, do Departamento de Engenharia de Cambridge e autor do novo estudo. “[No estudo], mostramos como essas pequenas gotículas podem se acumular em espaços fechados a longo prazo – e como isso pode ser mitigado com ventilação adequada. “
Fonte: Revista Superinteressante
Imagem: FG Trade/Getty Images