Aproxima-se o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Este ano, o certame está marcado por uma grande dúvida: como os candidatos, que mal tiveram aulas presenciais, comportar-se-ão nas provas? O alarmante número de 143 mil estudantes que tiraram zero nas redações do ano passado deixa a todos preocupados. Desses, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 56.945 deixaram a redação em branco. Outros 40.624 participantes fugiram ao tema; 23.265 participantes copiaram trechos do texto motivador e 22.902 foram enquadrados em outros motivos.
Escrever, seja uma redação ou texto qualquer, continua assustando milhares de pessoas. O problema não é recente, como provam os textos de muitos profissionais das mais diversas especialidades. São raros os que não necessitam de revisão, já que apresentam incríveis problemas. Por questões de espaço, elencarei apenas algumas questões gramaticais que, se dominadas, podem ajudar a tornar o texto mais leve e apagar a péssima impressão que se deixaria, caso não houvesse o domínio.
Percentagem e porcentagem – ao escrevermos, podemos optar pelas duas formas, sendo a segunda preferida dos dicionários. Se formos indicar uma porcentagem na escrita, também podemos optar: cinquenta por cento (com todas as letras) ou 50% (com algarismos). Evidentemente, a segunda opção é melhor, em virtude da economicidade. Contudo, outra característica fundamental é a clareza. Se formos escrever mais de um valor de porcentagem, repitamos o sinal em cada um deles: “Os salários vão subir entre 5% e 10%”.
Se o assunto é concordância, devemos ficar atentos. Se o número vem antes do verbo, é preferível concordar com o termo seguinte: “30% dos eleitores não compareceram às urnas”. Aqui mora um detalhe, pois a gramática permite a concordância com o número: “Aproximadamente 1% dos moradores foi (foram) protestar”. Caso o número percentual venha depois do verbo, só há uma opção: concordar com o numeral. Assim: “Compareceram 70% do eleitorado”. Outro ponto a destacar: se o numeral for determinado por um pronome ou artigo, a concordância tem de ser com ele. Desse modo: “Uns 15% dos estudantes abriram mão da isenção”; “Este 1% dos impostos fará falta”.
A distância e à distância – expressão tão usada em 2020, quando o assunto era educação, continua incompreendida por quem a usa. A questão é simples como ler frase em traseira de caminhão. Usaremos “a distância” quando a distância não for determinada: “Algumas instituições estão oferecendo ensino a distância”. Caso haja determinação da distância, usamos “à distância”: “Mantenha-se à distância de 100 metros”. Simples, não é?
Ora e hora – é claro que a pronúncia é a mesma, mas todo cuidado é pouco para não confundir no momento da escrita. “Ora” significa “por enquanto”, “por agora”: “O ministro disse que, por ora, não aumentará os impostos”. “Hora” é o equivalente a 60 minutos: “O professor ganha, em média, 50 reais por hora de trabalho”.
O moral e a moral – eis uma dupla que causa confusão. A diferença, na verdade, é de gênero. No masculino, indica estado de espírito, disposição de ânimo: “A vitória elevou o moral dos jogadores”. A forma feminina indica norma de conduta, moralidade: “Qual a moral da história?” Uma dica importante: o moral relaciona-se a astral; a moral, com lição de moral.
Dado as e dadas as – agora não se trata de escolha. Apenas uma forma está correta. “Dado” é forma de particípio do verbo “dar” e, como tal, concorda em gênero e número com o substantivo a que se refere: “Dadas as circunstâncias, o clima esquentou”; “Dado o histórico do aluno, não foi difícil verificar as notas”; “Dada a reação do público, o espetáculo agradou”.
Ainda mais – o “ainda” dispensa o “mais”. Trata-se de redundância muito comum em redações. Evite. Em vez de “O assunto ainda vai render mais discussão”, diga: “O assunto ainda vai render discussão”.
Em face de – é a forma correta. “Face a” não existe. Então, caso queiramos empregar na conclusão, digamos: “Em face do exposto, percebe-se que não há razões para questionar a veracidade das provas”. “Preserva tua língua do mal, e os teus lábios, para que não falem mentiras.” (Sl 34,14).
João Maria de Lima é mestre em Letras e professor de língua portuguesa e redação há mais de 20 anos.
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