Bolsonaro ganha o prêmio humorístico internacional ‘IgNobel’ por gestão da pandemia

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Jair Bolsonaro, Donald Trump e vários outros líderes mundiais estão entre os vencedores do prêmio humorístico IgNobel 2020, que todos os anos destaca os feitos mais peculiares da ciência. Os políticos levaram a categoria de “Educação Médica” como forma de ironizar as suas medidas anti-científicas na gestão da pandemia de Covid-19 em seus respectivos países.

O anúncio foi feito na quinta-feira (17) na 30ª edição do prêmio, que ocorreu pela primeira vez de forma online (em condições normais, a cerimônia é feita presencialmente na Universidade Harvard, nos Estados Unidos). Além do presidente brasileiro e norte-americano, levaram o prêmio também Boris Johnson, do Reino Unido; Narendra Modi, da Índia; Andrés Manuel López Obrador, do México; Alexander Lukashenko, de Belarus; Recep Tayyip Erdogan, da Turquia; Vladimir Putin, da Rússia; e Gurbanguly Berdimuhamedow, do Turcomenistão.

Eles foram escolhidos pelo feito de “usar a pandemia de Covid-19 para ensinar ao mundo que políticos podem ter um efeito mais imediato na vida e na morte do que cientistas e médicos”, segundo a justificativa. Todos, em maior ou menor grau, foram criticados por suas posturas negacionistas e/ou populistas diante o problema de saúde pública e por se distanciarem da ciência para tomar decisões.

Criado em 1991, o IgNobel é uma premiação paródia do prêmio Nobel – seu nome é um trocadilho com ele e a palavra ignoble (“ignóbil”). Todos os anos, a revista satírica Annals of Improbable Research escolhe premiar as “realizações que primeiro fazem as pessoas rirem, e depois as fazem pensar”. Em geral, o foco do são estudos inusitados e aparentemente bizarros, mas não necessariamente sem validade científica. No ano passado, por exemplo, um dos premiados foi um pesquisador que estuda se a pizza italiana previne o câncer – caso você esteja se perguntando, sim, especificamente a versão italiana da pizza.

No entanto, algumas categorias podem também premiar acontecimentos e atitudes anti-científicas ou simplesmente bobas e engraçadas, de forma irônica e crítica, como no caso dos líderes mundiais.

Quando se trata de estudos premiados, porém, a comunidade científica em geral leva o prêmio na esportiva, e os próprios pesquisadores vencedores participam da cerimônia. Eles têm 24 segundos para explicar o seu trabalho e, depois, resumem a sua pesquisa em apenas sete palavras. E engana-se quem acha que o IgNobel é meramente simbólico: ele inclui um valor trilionário como recompensa. Bem, mais ou menos.

Os pesquisadores levam pra casa uma nota de 10 trilhões de dólares zimbabueanos, a antiga moeda nacional do Zimbábue. Isso também é uma piada: a moeda foi tirada de circulação em 2009 por conta da enorme hiperinflação que assolou o país, a ponto de que o valor equivale a 40 centavos de dólar americano.

Nessa mesma época, o responsável pelo Banco Central do Zimbábue recebeu o IgNobel de matemática por “oferecer às pessoas uma maneira simples e cotidiana de lidar com uma ampla gama de números – de muito pequenos a muito grandes – ao fazer com que seu banco imprimisse notas que vão de um centavo ($.01) até cem trilhões de dólares ($100,000,000,000,000)”.

Humor crítico

Neste ano, o prêmio de “Educação Médica” foi entregue aos líderes mundiais para demonstrar à população como políticos podem ter um impacto profundo na saúde pública, maior até que cientistas e médicos – claramente com conotação negativa, e não de forma elogiosa.

Bolsonaro, um dos premiados, minimizou o perigo do vírus desde o começo da pandemia. O presidente se colocou contra medidas de isolamento social e promoveu tratamentos sem embasamento científico. A postura foi parecida com a de Donald Trump, também agraciado com o prêmio. EUA e Brasil estão no top 3 de países com mais casos e mortes por Covid-19 no mundo, juntamente com a Índia, cujo primeiro-ministro, Narendra Modi, também está na lista de vencedores.

Já Boris Johnson, primeiro-ministro do Reino Unido, foi criticado pela estratégia inicial do seu governo de adotar o “isolamento vertical” e tentar atingir a imunidade de rebanho deixando a população jovem e saudável se infectar livremente, mesmo sob duras críticas de cientistas e epidemiologistas. Mas logo a mortalidade disparou no país  – e o próprio Johnson foi parar na UTI após se infectar. A partir daí, o plano foi abandonado em prol do isolamento tradicional.

O presidente-ditador do Turcomenistão, Gurbanguly Berdimuhamedow, ganhou as manchetes mundiais ao proibir a palavra “coronavírus” no país e adotar uma medida extremamente negacionista da existência e do perigo do vírus. Foi assim também com Alexander Lukashenko, de Belarus, que atualmente enfrenta uma onda de protestos no país após uma reeleição com suspeitas de fraude eleitoral. No início da pandemia, ele chegou a recomendar vodka e sessões da sauna contra o coronavírus e chamou a pandemia de “psicose”.

Vale dizer que não é a primeira vez que Lukashenko recebeu o IgNobel: em 2013, ele venceu na categoria “Paz” por ter tornado ilegal aplaudir em público (muitos manifestantes haviam adotado o aplauso conjunto incessante como forma de protestar). Na mesma categoria, a polícia de Belarus também foi premiada naquele ano por ter prendido um homem que, supostamente, havia infringido a lei do aplauso. Só tem um detalhe: ele só tinha um braço.

Outros vencedores

A categoria que criticou os políticos não foi a única na edição de 2020. Como tradicionalmente faz, o IgNobel voltou a destacar os estudos científicos mais inusitados e engraçados do ano. Na categoria “Psicologia”, por exemplo, pesquisadores americanos e canadenses levaram o prêmio por terem desenvolvido um método para identificar pessoas narcisistas – apenas analisando suas sobrancelhas.

Na categoria “Física”, quem levou a nota trilionária foi um estudo que analisou o que acontece com o corpo de uma minhoca viva quando ela é colocada para vibrar em altas frequências. Em “Medicina”, pesquisadores holandeses e belgas se destacaram por terem identificado e caracterizado a “misofonia”: uma condição médica em que alguém se sente aflito, ansioso ou com raiva ao ouvir o som de outras pessoas mastigando.

Quem levou o troféu de “Ciências do Materiais” foram os cientistas que demonstraram que facas feitas de fezes humanas congeladas não funcionam tão bem (sim, isso é um estudo sério). Já no artigo vencedor da categoria “Entomologia”, pesquisadores reuniram evidências de que muitos entomologistas – cientistas que estudam insetos – têm medo de aranhas (que não são insetos, mas sim aracnídeos).

Em “Acústica”, pesquisadores que colocaram um jacaré numa câmara de gás hélio e depois analisaram a sua vocalização levaram a melhor. Na categoria de “Economia”, venceu um artigo que analisa a relação entre a desigualdade de renda de um país com a quantidade média de beijos na boca naquela nação (um dos coautores do estudo é brasileiro).

Uma categoria que também se aproximou da crítica ácida foi a da “Paz”. Os agraciados com o prêmio foram os governos da Índia e do Paquistão por suas medidas diplomáticas bastante inusitadas – como, por exemplo, colocar seus diplomatas para tocar a campainha um do outro de madrugada e depois sair correndo.

Outro prêmio que não foi para um estudo, mas sim para um feito incrivelmente estúpido, foi o da “Administração”. Os vencedores foram cinco assassinos de aluguel chineses pela seguinte história: o primeiro profissional foi contratado para realizar um assassinato e contratou o segundo para fazer o trabalho por ele em troca de uma parte do pagamento.

Esse, por sua vez, contratou um terceiro assassino sob as mesmas condições, que contratou um quarto, que, por fim, pediu a quinto para fazer o serviço, cada um com uma porcentagem menor do pagamento. No final, nenhum realizou o tal assassinato. É o cúmulo da terceirização.

Fonte: Revista Superinteressante

Imagem: divulgação

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