Medida mais eficaz no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus até o momento, o distanciamento social interferiu em muitas relações. Uma delas foi a forma de lidar com as tarefas domésticas, uma vez que o maior tempo de permanência em casa faz as pessoas perceberem que sempre há algo a se fazer. Além disso, surgiram novos cuidados como a desinfecção de compras e a higienização de roupas, sapatos e objetos de uso contínuo.
Porém como ficou a divisão dessas tarefas ao longo dos meses de isolamento? Com base em informações obtidas pela Pesquisa online sobre a contratação do emprego doméstico durante a pandemia da Covid-19, realizada entre os dias 25 de maio e 6 de junho, o Observatório Nordeste para Análise Sociodemográfica da Covid-19 (ONAS-Covid19) preparou um estudo para comparar a situação atual com a anterior ao distanciamento social.
De acordo com o artigo Os afazeres domésticos antes e depois da pandemia: desigualdades sociais e de gênero, aumentou a divisão igualitária das tarefas domésticas entre os membros adultos da família. Antes da pandemia, 85% dessa carga de atividades era feminina. No entanto, a partir do detalhamento dos números, o estudo revela que as mulheres permanecem sofrendo uma sobrecarga dos trabalhos da casa.
Entre os entrevistados, a resposta mais frequente à pergunta “quem está assumindo o trabalho doméstico que era realizado por esse(a) empregado(a)?” foi “As tarefas estão sendo divididas igualmente entre os membros do domicílio”, com 32%. Mas a soma dos que deram como retorno “as tarefas estão sendo divididas entre os membros do domicílio, mas com sobrecarga para a(s) mulher(es)” e “majoritariamente a(s) mulher(es)” atingiu a marca de 52%.
“Os resultados são animadores, em alguma medida, ao evidenciar o aumento de divisão mais igualitária dos afazeres dentro dos domicílios. Acredito que o aumento das tarefas em meio à pandemia, aliado a ausência do trabalhador doméstico, trouxe à tona a importância desse trabalho para a dinâmica dos lares e a necessidade da divisão mais igualitária. A dúvida que permanece é se essa situação será uma tendência pós pandemia”, explica a professora do Departamento de Demografia e Ciência Atuariais (DCCA/UFRN), Luana Myrrha, autora do artigo ao lado da também docente do DCCA, Jordana Cristina de Jesus.
Mesmo com o aumento da participação dos homens na divisão de tarefas domésticas, essa diferença foi mais observada em casais sem filhos do que naqueles com crianças pequenas. Segundo o estudo, ainda que 35,9% das famílias formadas por pai e mãe dividam as responsabilidades nos cuidados do lar, o nível de atribuições das mulheres não diminuiu necessariamente.
Recorte social
Por se direcionar a pessoas contratantes de empregados domésticos, o questionário acabou encontrando um perfil homogêneo para os respondentes, classificado pelas pesquisadoras como classe média. Em classes mais pobres, contudo, a divisão mais igualitária das tarefas domésticas provavelmente não ocorreu nas mesmas proporções encontradas na pesquisa, afirma a professora Luana.
“Quanto maior o nível de renda, em que cresce a predominância de brancos, menor a carga de trabalho doméstico. Isso acontece porque nos mais altos níveis de renda é possível adquirir serviços que substituem ou amenizam tempo dedicado a essas tarefas. Considerando que quanto menor a escolaridade maiores são as diferenças absolutas no tempo usado nas tarefas do lar entre homens e mulheres, espera-se que as mais pobres, em sua maioria negras, estejam ainda mais sobrecarregadas neste período”, conclui.
Este trabalho pode ser conferido na íntegra na página do ONAS-Covid19, na qual há atualizações de dados e análises sociodemográficas para diversos aspectos da pandemia do novo coronavírus.
Fonte: Agecom/UFRN