Batendo na porta dos 59 em uma quinzena, levanto olhar para a quinzena primeira da vida, lembrando do quanto Ponta Negra exercia fascínio para quem naquele tempo a tinha como algo a ser usufruído – de quando em vez, posto que longe, de difícil acesso, era sonho, consumo limitado, raro desfrutar.
Sortudo que sou, filho de um pai louco por praia, herança benigna que herdei e que até hoje incorporo, pude com meu saudoso genitor, em sua baratinha a motor, pegar caminho da hoje Roberto Freire e, em Ponta Negra, me jogar nas casas de tio Humberto/Nicinha e do padrinho de Lila e compadre da família, Walter Dore, curtindo criança banho de cacimbão, descendo para a praia em pranchas de isopor por caminhos abertos nas brancas dunas, entre vegetação espinhosa e litorânea, acessando o Morro do Careca após saudável caminhar, escalando, observando paisagem do alto, para depois literalmente voar morro abaixo, em saltos que disputávamos qual o mais longo, rivalizando com atletas planos, naquelas íngremes descidas inesquecíveis.
Depois nossos pais estimulavam nossa solidariedade para com eles, solicitando serviço de capturagem de tatuís, que eles saborearam ao óleo e/ou manteiga do sertão, com cerva e malte, enquanto nos bebíamos a famoso Grapette, que tio Dore ofertava em generosas garrafas trabalhadas artisticamente – em memorável design.
Depois Ponta Negra começou a ficar mais acessível, veio o paralelepípedo, asfalto, Via Costeira, o surf, as barracas, a vida boêmia, as gatinhas, o conjunto habitacional, o turismo e, hoje, aqui estou, como morador, contumaz peregrino de suas constantes possibilidades.
Acordo em sua geografia, fumego café, como, circulo, fotografo, amo, amo muito, intensamente, assim como o fiz por onde passei, Cirolândia, Tirol, Praia dos Artistas/Meio, Mãe Luíza, pois se meu primeiro guru me deixou algum ensinamento, foi: a vida flui aqui e agora, esteja intensamente no momento, estando portanto, em cada passagem do meu viver, apaixonado, integrado, radicalmente envolvido, pois só um mergulho profundo e intenso no que for que esteja sendo: família, trabalho, viagens, posições, habitações – possibilita a verdadeira vivência e a real existência que tanto almejamos.
Quem vive nas beiras, de migalhas, abstendo-se, não vive, apenas passa.
Escrevi tudo isso para reafirmar meu amor antigo, sólido, verdadeiro, por Ponta Negra, lugar que sempre sonhei um dia morar, hoje realidade compartilhada com a Candelária, depois de Mãe Luíza, e tantos outros bairros igualmente queridos.
Amo muito, fotografo, idolatro, reverencio. Indico, eis um templo ecumênico, eis um maravilhoso lugar.
Que situação, rapá…
Flávio Rezende aos vinte e oito dias, sexto mês, ano dois mil e vinte e vinte, 13h29.
Luzzzzz
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Crédito das Fotos: Arquivo Pessoal