O ser humano é por natureza e por definição científica um ser gregário e um ser que não pode viver sem se comunicar. Comunicação significa literalmente “pôr em comum”, dividir algo com alguém; ou seja, ao dividir suas ideias e seus pensamentos com alguém, você se comunica. E não escapamos, apesar ou por causa da revolução digital, de nos comunicar pela escrita.
É fato que se expressar em português com clareza e correção é uma das maiores dificuldades dos brasileiros. Contudo, muitos estão conscientes disso e querem melhorar, pois finalmente perceberam que precisam dominar a norma culta do idioma. Principalmente na vida profissional. Nunca, no mundo corporativo, houve tantas reuniões e apresentações. Nos dias atuais, em que a oferta de cursos e palestras a distância tem se difundido, a atenção à linguagem deve ser redobrada.
Quem não consegue articular pensamentos com clareza e correção tem um grande entrave à ascensão na carreira. A invenção do “e-mail” – já faz certo tempo – contribuiu para esse quadro, ao incrementar também a comunicação por escrito dentro das empresas. Afinal, é óbvio que é péssimo para a imagem de alguém enviar a um colaborador “e-mail” confuso ou com erros de português.
Como se sabe, a dificuldade com a clareza é um traço cultural no Brasil. Num país com tantas carências educacionais, falar de maneira rebuscada é indicador de “status”, mesmo que o falante não esteja dizendo “coisa com coisa”.
Uma forma de comunicação muito comum é o “burocratês”, a linguagem dos memorandos das empresas, nos quais, mesmo para solicitar a compra de uma caixa de clipes, são necessárias várias saudações e salamaleques. O linguajar pomposo também sobrevive nas teses acadêmicas e, como era de esperar, no discurso de advogados e juízes. Essa forma de comunicação há muito tempo causa “moda”, dando exemplos do que não se deve escrever. Vejamos exemplos daquilo que não devemos propagar, na fala ou na escrita.
“A nível de” – apesar de ser uma das preferidas de autoridades e figurões, a expressão deve ser evitada; assim como a sua amiguinha “em nível de”. Quando se diz “A nível de (em nível de) Brasil”, pode-se simplesmente dizer “No Brasil”. Em muitos casos, basta retirá-las. “Ele cursa pós-graduação em nível de doutorado”, diga-se: Ele cursa doutorado.
“Ele não se encontra no momento” – quem fala corretamente o idioma pode acreditar que a pessoa em questão está sofrendo de um temporário surto de desajuste emocional. Dizer simplesmente que “ele não está” pode evitar esses mal-entendidos.
“No sentido de facilitar as coisas” – melhor mesmo não complicar. Diga: “para facilitar”.
“Enquanto mulher me sinto discriminada” – o fator de discriminação deve ser o mau emprego da conjunção “enquanto”, que só tem conotação temporal. Melhor dizer: “como mulher”, “na condição de mulher”.
“Vamos se encontrar” – impossível. A primeira pessoa do plural (nós vamos) nunca se encontra com a terceira do singular (se). Há que se dizer: “vamos nos encontrar”.
“Houveram muitos presentes” – quem está ausente é a concordância. Quando significa existir, o verbo “haver” é impessoal e não deve ser flexionado. Diz-se: “Houve muitos presentes”.
“Segue anexo as faturas” – dupla falta. “Seguem anexas as faturas” é como deve ser.
“Há quinze dias atrás” – ou um ou outro. “Quinze dias atrás” ou “há quinze dias”.
“Tenho um amigo meu” – Se você o tem, é claro que ele é seu. Não é preciso reforçar. Elimine o “meu”.
“Excelentíssimo Senhor, em resposta à vossa carta” – O “Excelentíssimo Senhor” é uma terceira pessoa do singular, que, apesar de muito importante, não aceita o imponente “vossa”, destinado à segunda pessoa do plural. Escrevamos: “em resposta a sua carta”.
“É com prazer que comunicamos…” – há quem só saiba iniciar textos assim. Não é necessário ter tanto prazer para escrever uma carta comercial, um ofício.
“Limitados ao exposto, com estima e consideração” – não é necessário ter estima nem consideração para encerrar um texto. Outro detalhe: se você está limitado, não avise seu leitor disso.
“Sendo o que se nos oferece para o momento, ‘subscrevemo-nos’, ou, ‘firmamo-nos’” – isso não se usa há mais de 30 anos. Não é necessário mencionar que você está firmando a carta, ela precisa ser assinada.
“Sem mais para o momento…” – Se você tivesse mais, diria.
Falar e escrever de forma simplificada, numa linguagem clara e objetiva, além de transmitir aos interlocutores a mensagem, deixa uma ótima impressão; afinal “Assim também vós, se com a língua não pronunciardes palavras bem inteligíveis, como se entenderá o que se diz? porque estareis como que falando ao ar” (1Co 14,9).
*Texto publicado originalmente na Tribuna do Norte em 14 de junho de 2020.
João Maria de Lima é mestre em Letras e professor de língua portuguesa e redação há mais de 20 anos.
Crédito da Foto: Reprodução/História do Brasil Já