A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, negou recursos pedidos pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern) e pelo Município de João Câmara para suspender sentença da 2ª Vara da Comarca de João Câmara que determinou que a empresa estadual de saneamento e a Prefeitura, conjuntamente, forneçam água tratada aos moradores daquele município, de forma ininterrupta, por qualquer meio adequado.
Pela determinação, mantida pelo TJRN, poderá ser usado, inclusive, carros-pipa, se necessário, quando o desabastecimento superar mais de cinco dias e, enquanto durar o desabastecimento, garanta o fornecimento de 150 litros/habitante/dia de água para a população, sob pena de multas diárias em desfavor da companhia e do Município. A determinação atende a pedido feito em Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual.
No recurso da Caern, a empresa requereu a nulidade da sentença sob o fundamento de que esta ultrapassou os pedidos autorais, eis que seu fundamento de decidir vai além dos limites do pedido elaborado na petição inicial. Sustentou que a autora limitou-se a requerer o abastecimento de água do município de forma ininterrupta, adequada, eficaz e contínuo, enquanto a sentença determina que deve ser fornecida a quantidade de 150 litros habitante/dia.
Argumentou ainda: a situação de emergência pela estiagem prolongada; recomendação de redução de captação de água do Olheiro de Pureza e da paralisação temporária nos fins de semana; não foi omisso na distribuição de água ao Município de João Câmara; fornecer a quantidade de água estipulada requer sistema adutor e impossibilidade de usar carros-pipa; entre outros argumentos.
Decisão
Porém, quanto às alegações de que é impossível o cumprimento do fornecimento dos 150 litros/habitante/dia de água à população de João Câmara, o relator do recurso entendeu que, apesar da existência de Decretos de Situação de Emergência relativos ao abastecimento de água no Estado em razão do fenômeno da estiagem prolongada, tal determinação se mostra possível, porque a própria Caern afirma que o sistema de abastecimento de água da região vem trabalhando com uma “vazão” superior à necessária ao fornecimento de 150 litros/habitante/dia de água.
Além do mais, explicou que, dos pareceres técnicos juntados ao processo pela Caern, extrai-se a informação de que o volume de água distribuído para João Câmara em uma situação normal de abastecimento atende à demanda requerida pelo município, considerando uma estimativa de consumo per capita de 150 litros/habitante/dia, bem como que os problemas técnicos enfrentados foram corrigidos e não geraram grandes impactos sobre o abastecimento de água em questão.
O relator, juiz convocado Eduardo Pinheiro, também não acolheu os argumentos da Caern de que não possui obrigação legal de fornecer água ao Município de João Câmara, sob o fundamento de inexistência de contrato celebrado com este público. O magistrado ressalta que a água é um bem essencial à vida e a Caern, enquanto ente público estatal e detentora do monopólio da prestação do serviço de fornecer água, possui a primordial função social de fornecer água à população compreendida na extensão dos limites territoriais da sua atuação, o que supera a existência de contrato para obrigá-la a cumprir o seu propósito.
O juiz Eduardo Pinheiro também rejeitou as alegações da empresa estatal de que o sistema de abastecimento de água do Município de João Câmara é deficitário, porque entende que é de sua inteira responsabilidade fiscalizar os desperdícios e regularizar as cobranças aos consumidores sem causar-lhes prejuízo quanto ao serviço prestado, em atenção ao princípio da eficiência dos serviços públicos.
Ele também afastou as alegações do Município de João Câmara de que somente a Caern é responsável pelo fornecimento de água às suas comunidades e que deve ser afastada a sua condenação neste sentido. Isto porque a Constituição Federal atribui aos municípios originariamente a responsabilidade pela organização e prestação dos serviços públicos de interesse local, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão.
“Por conseguinte, frise-se que inexiste nos autos instrumento delegatório capaz de afastar essa responsabilidade do Município de João Câmara, de maneira que não há falar em responsabilização unicamente da Caern pela prestação eficiente do serviço de fornecimento de água em questão”, concluiu, mantendo as determinações de primeira instância.
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Fonte: TJRN