Anunciado pela própria Prefeitura de Natal por um valor de R$ 8 milhões, o hospital de campanha montado para atender pacientes do novo coronavírus, no antigo Hotel Parque da Costeira, já tem contratos que ultrapassam R$ 28 milhões. Os dados estão em publicações no Diário Oficial do Município. Mais de R$ 25 milhões seriam apenas para mão de obra, mas a Secretaria de Saúde diz que os contratos também abrangeriam outras unidades e não apenas o hospital de campanha.
O Sindicato dos Médicos do Estado fez uma representação ao Ministério Público pedindo apuração sobre os valores e também entrou com uma ação civil pública solicitando liminar na Justiça para impedir o município de terceirizar ou “quarterizar” mão de obra médica. De acordo com o sindicato, embora a empresa tenha sido contratada para fornecer os profissionais, não teria nenhum médico contratado e iria disponibilizar a mão de obra através de uma cooperativa.
Todos os contratos foram feitos com dispensa de licitação, ou seja, não passaram pelo processo normal de concorrência pública, por causa dos decretos estadual e municipal de calamidade pública em razão da pandemia do novo coronavírus – causador da Covid-19. As empresas são convidadas a apresentar as propostas e vence a que tiver menor preço. “Toda publicidade dos atos administrativos estão em conformidade com a legislação vigente que encontra-se excepcionalmente em vigência devido a Pandemia do Covid-19”, argumenta a prefeitura.
O Hotel Parque da Costeira estava fechado e teve uso autorizado pela Justiça do Trabalho em março deste ano. A previsão era de que a unidade entrasse em funcionamento no último dia 15 de abril, com 120 leitos, sendo 100 de enfermaria e 20 de UTI – Unidade de Tratamento Intensivo. O prazo não se concretizou.
A Secretaria Municipal de Saúde afirma que está nos “ajustes finais”, aguardando entrega dos materiais pelos fornecedores, que incluem equipamentos, insumos e materiais médico-hospitalares, mas não informou uma nova data de inauguração.
“Como de conhecimento público, todos os estados e países encontraram dificuldade na aquisição, em razão de se tratar de pandemia, com grandes reflexos na oferta de produtos que estão sendo buscados por todos os entes”.
Juntos, os três contratos da prefeitura com empresas para fornecimento de serviços somam R$ 28.619.357,75. São eles
- Serviços gerais de recuperação, reforma e adequação do Hospital de Campanha de Natal – R$ 2.157.246,35
- Contratação de empresa especializada para execução de serviços de mão de obra qualificada de assistência a saúde nas funções de assistente social, auxiliar de farmácia, bioquímico, enfermeiro, farmacêutico, médico nutricionista, psicólogo, técnico em enfermagem, técnico em radiologia e técnico em laboratório, conforme especificações técnicas, para atender às necessidades exigidas no Plano de contingência no Combate ao COVID 19, no Município de Natal, Pelo período de 180 dias, com solicitações de acordo com a demanda – R$ 19.158.626,40
- Contratação emergencial de empresa especializada para execução de serviços de mão de obra qualificada de assistência a saúde nas funções de copeiro, higienista hospitalar, maqueiro, recepcionista e outros, para atender as necessidades exigidas no Plano de contingências no Combate ao (COVID-19), no município de Natal, para garantir o atendimento durante o período de 180 dias – R$ 7.303.485,00.
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde afirmou o valor de R$ 8 milhões foi “o estimado para as obras de infraestrutura e adequações necessárias para transformar os leitos do hotel, em leitos hospitalares, considerando que estamos falando de implantação de um hospital de campanha que irá tratar uma pandemia”.
Ainda de acordo com a pasta, o contrato de R$ 19 milhões refere-se à contratação de empresa especializada em terceirização de pessoal da área de assistência à saúde, pelo prazo de 180 dias, ou seis meses, no total de 384 profissionais que trabalharão em turnos de 12 horas por 36 de descanso. Além disso, afirmou que eles serão destinados a toda a rede de enfrentamento à pandemia, incluindo mais duas unidades, além do Hospital de Campanha – o Hospital dos Pescadores e o Hospital de Pediatria.
“Porém, cabe informar que as contratações ocorrerão de acordo com a evolução do quadro epidemiológico do município, sendo os quantitativos mencionados, estimados, podendo ser implementados em todo ou em parte, a depender da necessidade da Administração, conforme contrato firmado”, afirmou a SMS.
Em representação enviada ao Ministério Público, o Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Norte solicitou que a Prefeitura seja intimada a prestar informações acerca dos contratos e, caso contrário haja a instauração de inquérito civil ou o ajuizamento de ação civil pública em desfavor do gestor público responsável pelo cumprimento das medidas.
No pedido, a entidade ainda afirmou que há “um risco enorme e iminente de malversação de recursos públicos, o que atrai a necessidade imperiosa e inadiável de atuação” do Ministério Público.
Contratações
O sindicato também entrou com uma ação na Justiça do Trabalho para tentar impedir que a empresa contratada pela prefeitura execute o serviço de mão de obra médica através da contratação de profissionais de cooperativas, que não teriam direitos trabalhistas garantidos, através dessa forma de trabalho.
Para o presidente do sindicato, Geraldo Ferreira, a medida é preocupante principalmente durante uma pandemia, porque, através desse tipo de contrato, os profissionais que estariam expostos aos riscos de contrair a Covid-19 não teriam nenhuma garantia, como afastamento remunerado.
“O curioso é que a empresa contratada para prestar a execução de serviços de mão de obra, de assistência à saúde (…) não possui em seus quadros os profissionais médicos, querendo realizar a contratação de tais profissionais médicos através de novo contrato via cooperativas. Excelência, como uma empresa que fora contratada através de dispensa de licitação pretende terceirizar atividades-fim por meio de cooperativas de intermediação de mão de- obra?”, questionou o sindicato na ação.
“Realizada a contratação emergencial (estado de calamidade), esperava-se que a empresa contratada pelo Município realizasse contratação de pessoal que suprisse, minimamente, a demanda da rede de saúde da cidade. Ocorre que, no caso dos profissionais médicos, tais medidas estão sendo realizadas através de subcontratação, via cooperativas”, apontou ainda.
O pedido do sindicato é de que o contrato seja interrompido e que a prefeitura e a empresa sejam impedidas de fazer esse tipo de contratação. Ainda pede que os profissionais sejam contratados através de concurso temporário ou contratação direta pelo próprio município.
Crédito da Foto: Sara Cardoso/Inter TV Cabugi
Fonte: G1 RN