Pandemia de uma doença sem cura e incertezas sobre o futuro, agravadas pelo isolamento social, levam a ansiedade. Ansiedade leva a insônia e a outros distúrbios do sono. Noites mal dormidas geram mais ansiedade, sintomas depressivos e desequilíbrio do corpo. Que, por sua vez, pode ficar mair fraco para o combate a doenças. O ciclo, que tende a ser um problema no contexto do coronavírus, pode e deve ser interrompido, como observam especialistas. Ou pelo menos amenizado, com hábitos diários que privilegiem a saúde mental e organizem uma rotina de períodos de vigília e sono para que mente e corpo sigam funcionando bem.
— Um conjunto de fatores, neste momento, pode afetar o sono da população. O estresse, a preocupação, a mudança de hábitos de vida, o sedentarismo e o distúrbio de ritmo podem levar a períodos de insônia e a sintomas de sonolência em alguns momentos do dia — explica a médica Dalva Poyares, pesquisadora do Instituto do Sono, de São Paulo.
Ela observa um movimento curioso de seus pacientes, tanto no agravamento dos distúrbios quanto em sua suavização nas últimas semanas:
— Alguns melhoraram da insônia por estarem afastados da fonte de estresse do trabalho e metas, já outros pioraram, pois se preocupam com a vida e a ausência de atividades e não conseguem se planejar, o que leva a uma frequência maior entre eles de sintomas de ansiedade e depressão — diz.
Se o seu caso é o de quem não anda conseguindo dormir com a cabeça cheia de preocupações, investir na rotina pode ser a solução. Tanto nas tarefas diárias quanto na observação da hora de acordar e dormir. Nada de ficar vendo filme até mais tarde, tirar uma soneca no meio da tarde ou trocar o dia pela noite trabalhando. Até obedecer ao “ciclo da luz e do escuro”, mantendo-se acordado durante o dia e dormindo durante a noite, é importante neste momento, quando o cérebro precisa “entender” a hora do descanso para trabalhar em funções vitais, regenerando o corpo, a imunidade e as reservas de energia.
Para quem tem problemas de apneia obstrutiva do sono e faz uso de aparelhos de “pressão positiva contínua nas vias aéreas” (CPAP, do inglês Continuous Positive Airway Pressure), a médica não indica a suspensão de seu uso, mas recomenda cuidados extras na higienização do equipamento. Já pacientes com apneia sem acesso ao CPAP, aparelhos bucais e cirurgias (suspensas no momento) podem investir em caminhos alternativos.
— Eles devem dormir de lado e evitar bebidas alcoólicas, aumento de peso e medicamentos com efeito de relaxamento muscular — explica.
Cuide da qualidade do seu sono:
– Cada um tem um ritmo. A duração ideal do sono varia conforme a idade e a pessoa e pode, inclusive, ter influência genética. Mas é importante manter uma rotina de vigília e sono adequada à sua fisiologia, com horários regulares para acordar e dormir.
– Alimentação saudável e demais rotinas irão manter o equilíbrio do corpo e da mente. Com a ausência de obrigações com horários marcados, indivíduos podem dormir e despertar mais tarde que o habitual e atrasar seu ritmo a cada dia, alterando funções fisiológicas.
– A duração do sono que te faz sentir bem não deve ser prolongada. Evite ficar muito tempo na cama.
– Evite cochilar durante o dia, isso pode atrapalhar sua noite de sono, além de diminuir sua produtividade nas funções do dia.
– Saia do quarto e não fique de pijama o dia todo. Mantenha-se ativo e faça o corpo entender este período de atividade.
– Busque a luz do dia: mantenha-se em locais onde o sol incida na sua casa, especialmente pela manhã. A luz do dia melhora o humor e ajuda a sincronizar o ritmo biológico.
– Faça atividades físicas diariamente. Se você não tem prática ou apresenta alguma lesão ou doença que possa limitar o exercício, busque uma supervisão profissional, como uma aula monitorada à distância, por vídeo.
– Para diminuir o estresse, controle o volume de informações consumidas e as horas passadas em frente ao celular ou computador e nas redes sociais.
– Pesquise atividades que você possa gostar de fazer durante o confinamento, como ouvir música, assistir a filmes, arrumar e renovar ambientes da casa, cozinhar coisas novas etc. Isso poderá te deixar menos ansioso.
– Exercícios de conscientização respiratória e de meditação podem ajudar neste momento.
– Afaste o negativismo e concentre-se nos problemas reais e que podem ser efetivamente resolvidos. Não antecipe problemas e jamais leve as preocupações para a cama. Se for o caso, divida o dia em períodos em que você “pode” se preocupar e períodos “de descanso”, em que você se libera mentalmente dos problemas e nem fala sobre o assunto com outras pessoas.
– Mantenha-se conectado com familiares e amigos e agende encontros virtuais pelo celular ou computador. A vida social é importante neste momento e deve ser mantida.
– Pacientes com apneia de sono acentuada e que fazem uso regular de aparelhos como o CPAP não devem interromper o tratamento. Mas é importante ter o cuidado extremo com a higiene deste tipo de aparelho, que tem contato direto com a via respiratória. Não deixe ninguém tocá-lo, lave-o com frequência e siga as diretrizes de higienização indicadas por sociedades médicas em seus canais.
– Assim como a insônia, a hipersonia (quando a pessoa tem uma sonolência excessiva) também pode ser indicativa de estados depressivos. Se você não estiver conseguindo controlar o estresse e ansiedade e isso estiver comprometendo sua qualidade de vida, busque ajuda em sua rede de apoio, com amigos, familiares e, se for o caso, profissionais de saúde. Com informações de Dalva Poyares, médica pesquisadora do Instituto do Sono e professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Crédito das Imagens: Editoria de arte
Fonte: O GLOBO