O que O Irlandês, História de um Casamento e Dois Papas têm comum? Os três longas foram produzidos em 2019 pela Netflix, e todos eles possuem boas chances de aparecer na disputa do Oscar.
A edição deste ano do prêmio, que acontecerá no dia 09 de fevereiro, pode ser a decisiva para quebrar, de uma vez, a barreira entre o cinema e o streaming – algo que, para alguns diretores consagrados, ainda não é totalmente aceito. A confirmação virá no dia 13 de janeiro, quando a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, responsável pela entrega do Oscar, anunciará os indicados de 2020.
A trajetória da Netflix no Oscar começou de forma tímida em 2014 com The Square, documentário sobre as manifestações no Egito durante a Primavera Árabe, em 2011. No ano seguinte, Virunga conseguiu uma indicação para Melhor Documentário. Em 2016, a Netflix emplacou outras duas produções nessa categoria: What Happened, Miss Simone? e Winter on Fire. Naquele ano, Beasts of no Nation poderia ter sido a primeira ficção da empresa a aparecer no Oscar, mas acabou esnobado (apesar das críticas positivas).
Em 2017, outras três indicações: Melhor Documentário (A 13ª Emenda) e Melhor Documentário em Curta-Metragem (Extremis e Os Capacetes Brancos, que acabou levando a estatueta). Em 2018, além do Oscar para o documentário Icarus, o longa Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississippi se tornou o primeiro de ficção da Netflix a entrar no Oscar. Disputou quatro categorias: Roteiro Adaptado, Fotografia, Canção Original e Atriz Coadjuvante (Mary J. Blige).
Antes de Roma/Depois de Roma
Mesmo com essas conquistas, o verdadeiro pontapé da Netflix no Oscar veio em 2019. Roma, drama mexicano de Alfonso Cuarón, foi indicado a dez categorias, incluindo Melhor Filme. Levou três: Filme Estrangeiro, Fotografia e Direção – todos para Cuarón (que deve ter comprado uma prateleira extra depois dessa noite). Apesar de não ter levado o prêmio principal, o longa, sem dúvida, foi um dos destaques do ano.
Um dos candidatos a reprisar o sucesso de Roma é O Irlandês. A Netflix investiu grana de filme blockbuster (mais de US$150 milhões) para que o diretor Martin Scorsese (Taxi Driver, Touro Indomável) juntasse Robert De Niro, Al Pacino e Joe Pesci em uma história de máfia que se passa ao longo de quatro décadas. Boa parte desse dinheiro foi para as (ótimas) maquiagens digitais, que rejuvenesceram os atores (e que pode ser lembrada na categoria de Efeitos Visuais).
O filme acabou virando meme por conta de sua extensa duração (3h30min), e pelas declarações de Scorsese sobre filmes de super-heróis. Mas isso não afetou a qualidade da produção, que já conquistou importantes prêmios, como o National Board of Review e o New York Film Critics Circle Award. Além disso, está indicado em diversas categorias no SAG (premiação do Sindicato dos Atores) e no Globo de Ouro, que acontece no próximo domingo (6).
Mas ele não é o recordista de indicações nesta edição do Globo de Ouro. Este título pertence ao seu “companheiro de equipe”, História de um Casamento, que conquistou uma indicação a mais (seis), incluindo Melhor Drama (assim como O Irlandês).
Dirigido por Noah Baumbach, o filme conta a história de um casal em processo de divórcio, e impressionou os críticos pelo roteiro simples e, ao mesmo tempo, profundo, e pelas atuações de Adam Driver (o Kylo Ren de Star Wars) e Scarlett Johansson (a Viúva Negra dos Vingadores).
As indicações de ambos são praticamente certas. História de um Casamento estreou em agosto no Festival de Veneza e, de lá pra cá, já venceu prêmios como o Gotham Awards, entregue em Nova York para produtores de filmes independentes, e foi incluído em listas de melhores filmes do ano, como a da American Film Institute e da revista americana Time.
Façanha histórica
O terceiro candidato da Netflix corre por fora. Dois Papas foi dirigido pelo brasileiro Fernando Meirelles, que já concorreu a melhor diretor no Oscar por Cidade de Deus. Seu novo filme imagina os diálogos que podem ter acontecido no Vaticano entre os papas Bento XVI e Francisco, antes da renúncia do primeiro, em 2013. No Globo de Ouro, foi lembrado em quatro categorias: Drama, Roteiro e duas de atuação para Jonathan Pryce e Anthony Hopkins. A indicação para o Oscar de Melhor Filme ainda não é certeira, mas é bem provável que Pryce e Hopkins apareçam entre os indicados.
Se a Netflix conseguir emplacar os três longas na categoria principal, será uma baita façanha. Afinal, a última vez que isso rolou foi em 1982 (38 anos atrás), quando a Universal disputou com Atlantic City, Reds e Indiana Jones e Os Caçadores da Arca Perdida – ironicamente, o prêmio não foi para nenhum deles, e sim para Carruagens de Fogo, da Warner Bros.
Antes disso, o feito era relativamente comum – faz sentido, pois havia menos estúdios e distribuidoras no mercado. A Paramount já havia conseguido a façanha em 1975; a Warner, em 1942. A 20th Century Fox fez o mesmo em três ocasiões: 1944, 1978 e 1980.
A United Artists conseguiu em 1940 e em 1961 – da primeira vez, foram quatro filmes na disputa. Mas nesse assunto, ninguém ganha da MGM, que emplacou três indicados em 1935, quatro em 1936, 1939 e 1940, e cinco em 1937. Vale explicar: boa parte das primeiras cerimônias do Oscar eram como hoje, e permitiam até dez concorrentes. O limite de cinco indicados durou majoritariamente de 1945 a 2009.
No fim, tudo ficará claro com os anúncios das próximas semanas: além dos indicados do Oscar, saem também as listas do Sindicato dos Diretores (DGA) e o dos Produtores (PGA), considerados os principais termômetros da premiação principal. A Netflix quer o seu troféu de Melhor Filme – e rápido.
Fonte: Revista Superinteressante
Imagem: Netflix/Reprodução