Crônicas da Velha Ribeira (77)

CELSO MARTINS

Celso Paiva Martins nasceu em 1920, na fazenda Caieira, propriedade de seu pai, no município de Portalegre, na região da “tromba do elefante” e quando entaludou, passou a trabalhar na fazenda – como era costume entre os sitiantes – ajudando o pai e irmãos nas árduas tarefas diárias, até 1933, ano em que veio
morar em Natal, com o tio Vicente Martins Fernandes, aqui estabelecido desde 1922, quando fundou a firma Martins Irmão & Cia, localizada na rua Frei Miguelinho, aqui nesta Velha Ribeira. Na casa do tio Vicente, a quem considerava um “segundo pai”.

A vida também não era moleza, se bem que mais leve do que
nos tempos da fazenda. Complementou os estudos primários com professores particulares e teve mestres como os professores Severino Bezerra e Clementino Câmara, até o ano de 1936, quando entrou na Escola de Comércio, com o objetivo de formar-se em “guarda-livros”, como se chamavam os contadores, naqueles
tempos. Por essa época, trabalhava na firma do tio Vicente e, como lidava com couros e peles o dia inteiro, ao chegar à escola, os colegas reclamavam do forte odor que exalava, cheiro esse impregnado em seu corpo após um dia inteiro de trabalho com aqueles artigos e isso o incomodou de tal modo que, segundo seu próprio relato, no livro “Da infância à velhice”, que escreveu quando completou oitenta anos, apressou-se a comprar um vidro do perfume “Royal Briar”, com o qual se borrifava antes de enfrentar a classe. Foi pior, conforme registra: a mistura do aroma do perfume com o cheiro dos couros gerou uma fragrância assaz desagradável, de modo que aqueles mesmos que reclamavam antes, lhe suplicaram que desistisse do “Royal Briar”, porque acharam mais confortável a
simples emanação das “lembranças” dos couros…Formou-se em contabilidade, cresceu na empresa, da qual tornou-se sócio no ano de 1945.

Em consequência da Segunda Grande Guerra Mundial, entre os compradores europeus para quem a firma exportava couros, peles, cera de carnaúba, alguns faliram e a empresa, tal como outras que
lidavam com o comércio exterior, enfrentou dificuldades, mas, terminado o conflito, a economia mundial começou a recuperar-se e aos poucos foi voltando ao ritmo normal. A empresa cresceu e seu trabalho teve grande destaque na consolidação da mesma entre as maiores exportadoras, no Estado. Granjeou prestígio, a ponto de ter
sido “anfitriã” do Banco Nacional do Norte, quando aquele estabelecimento de crédito instalou filial em Natal, inaugurando uma nova era no setor bancário, a começar pela localização de sua agência, a primeira na Cidade Alta. Do alto do seu temperamento calmo, até mesmo um pouco arredio – exceto quando se tratava do time do América Futebol Clube (de Natal, Rio Grande do Norte) – Celso, cultivou grandes amizades e inspirou, entre os mais chegados, a criação de um clube fechado que se reunia uma vez por
semana pra “jogar conversa fora” e tomar umas biritas, do qual faziam parte Ferreirinha, Aírton Costa, Rômulo “minha gata”, Jorge Amaral, Júnior “xororó”, Amaury Fonseca e Paulo Sérgio Furtado.

O grupo frequentava locais variados como o América; o bar Executivo da Associação Comercial; o Gramil; o Bar das Bandeiras; o da Camisaria Hombre e que tais. Nos seus últimos anos de vida,
andaram experimentando o Clube de Radioamadores,  mas ele reclamava das escadas e o grupo deixou de ir lá. Trabalhou praticamente até a hora do chamado final, indo diariamente ao seu escritório no térreo do Edifício Mirmão, na esquina da Frei Miguelinho com a Esplanada Silva Jardim, onde, sem a rigidez do horário comercial, recebia os amigos e cuidava de coisas pessoais, fazendo anotações que julgava necessárias.

Viveu mais de noventa anos, e quando fez a última viagem, deixou o legado de uma vida marcada pelo trabalho, correção e honestidade. Cumpriu à risca, na vida social e profissional, seu papel de homem de bem.

Deixou muita saudade!

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