Crônicas da Velha Ribeira (59)

O saudoso empresário Roque Araujo de Azevedo – conhecido da metade da população natalense, pelo apelido DUDU – não tinha curso superior, porém era dono de um invejável tirocínio comercial. Tanto é que foi o pioneiro na atividade de locação de automóveis aqui na cidade dos Reis Magos.

Enxergando longe, foi nos tempos em que era motorista de praça no período pós- guerra, que percebeu ser pelos carrões, a preferência dos americanos.

Ora, nas praças de carros locais – principalmente na da Tavares de Lira, onde situavam-se os hotéis Internacionais e Grande Hotel, preferidos pelos gringos mais importantes – os automóveis eram os populares Ford e Chevrolet. Aqueles menos importantes, que hospedavam-se no Hotel Avenida e no Hotel 2 Leões, ambos na praça Augusto Severo, ao contrário dos graduados, não ligavam p´ra isso.

Essa afluência americana após o término do conflito, provavelmente deveu-se ao desmonte das operações em “Parnamirim Field”, como era conhecida a segunda mais importante base aérea fora dos Estados Unidos durante a guerra, perdendo apenas para a de Pearl Harbor, no Havaí.

Foi por isso que DUDU comprou um Pontiac e depois, um Nash, passando a ter a preferência dos homens do Tio Sam.

E, no convívio diário com eles, percebeu também que eles gostavam de dirigir os carros, o que o levou, alguns anos mais tarde a fundar a Locadora DUDU, que chegou a ter mais de cem carros, todos comprados à vista.

Nas conversas com o grupo de amigos que sempre se reuniam aos sábados na sede da Locadora, alí na descida da Rio Branco – boca de entrada para esta Velha Ribeira, para quem vem da Cidade Alta – DUDU divertia-se contando as insistentes ofertas para a compra de sua locadora, trazidas por executivos das grandes, no Sul do País…E os cabras se espantavam ao tomar conhecimento de que o total da frota dele era todo pago. Porque a praxe – segundo eles – era 30% de capital próprio e 70% de leasing…Mas, voltando ao tempo mais antigo, no pós- guerra, veio também p´ra cá a British South American Airways, cujo diretor local era um major da RAF, que passou a ser usuário dos carrões de DUDU. Fizeram amizade – guardados os limites da fria educação britânica – e até conversavam durante os trajetos diários Natal/Parnamirim/Natal. Daí que, certo dia, aconteceu o seguinte diálogo entre os dois: Mister Bennet – era esse o nome do home – tomou conhecimento do namoro de DUDU com uma aeromoça da companhia e, do banco traseiro do Nash, entre uma baforada e outra em seu cachimbo, falou em tom de censura: “Mister Dúdo, namorando moça inglesa”… “É verdade, mister Bennet” – respondeu DUDU, com sua conhecida humildade e encarando-o pelo retrovisor interno.

“Non estarrr cerrrto” – continuou o velho militar, carregando nos “RR”, moça inglesa alta, loura, bonita! “É, mister Bennet” – tornou DUDU, dessa vez sem o encarar: “Mister Bennet manda o capitão Fulano em missão na Inglaterra e na sua ausência, visita a mulher dele. Isso está certo?”…O cachimbo saiu da boca, ouviu- se uma engasgada e mister Bennet finalizou: “Non se falarrr mais nisssso”.

Quando voltou p´ra Inglaterra, Mister Bennet deixou um relógio de ouro, de presente para DUDU.

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