Crônicas da Velha Ribeira (42)

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O Armazém Pará, “nasceu” aqui nesta Velha Ribeira, sob o comando dos irmãos Pedro e Rui Câmara de Souza, filhos do lendário João Paulo de Souza, o “seu Juca”, como ficou conhecido e era tratado por todos – inclusive os filhos – à partirda aposentadoria.

Até falecer – aos cento e dez anos – seu Juca, tendo começado com uma bodega no bairro das Rocas, teve a sorte de ver os descendentes desenvolverem o negócio que fundou, transformando-o numa das maiores casas de material de construção nesta praça. Amigo dos irmãos Souza, foi Pedro a quem recorri para guardar em seu armazém, na rua Almino Afonso – primeiro endereço do Armazém Pará – um imenso caixão de madeira com produtos importados, de propriedade de dois empresários oriundos do Amapá, que planejavam fundar uma importadora aqui em Natal e tinham aberto conta no Unibanco, onde eu era o gerente. Depositaram uns cinco mil em dinheiro e um cheque de oitenta e seis mil sacado contra o Banco Real, na praça de Ponta Porã-Mato Grosso do Sul.Mas isso era apenas uma ninharia, porque, segundo nos disseram, um sócio que teria ficado no Amapá para liquidar os negócios deles naquele Estado, dentro de poucos dias estaria remetendo cerca de dois bilhões para a conta aberta no Unibanco. Era muito dinheiro.

Os dois empresários eram concunhados e esposas – uma delas grávida – filhos, até a sogra os acompanhavam. Alugaram um apartamento de um empresário local, com quem fizeram amizade e eram frequentemente recebidos em sua casa. No comércio local, compraram móveis e eletrodomésticos para uso naquele apartamento. Numa revendedora de automóveis, compraram um carro usado.

Tudo isso, pago com cheques pré-datados, sacados contra nossa agência…

…Para serem cobertos quando aquela montanha de dinheiro chegasse.

A conversa dos cabras era muito aprumada, eles eram educadíssimos e aparentavam uma relação familiar estável e cordata. Mas, quando um deles interessou-se por uma casa que eu tava vendendo e preencheu um cheque, também pré-datado, pelo valor pedido e sem que sua mulher a tivesse visto, a luz – que já tava ficando amarelada – avermelhou-se de repente. Nunca ví um camarada comprar uma casa pra morar, sem mostra-la primeiro à cara metade. Liguei pro empresário dono do apartamento alugado a eles e externei-lhe minha desconfiança. Ele não se abalou, dizendo que tinha plena confiança nos seus inquilinos. No entanto, naquela noite fui acordado por um telefonema dele p´ra dizer que os cabras tinham despachado a família e tavam no apartamento, na maior farra. À essa altura, eu já tinha ligado pro banco de Ponta Porã e o gerente me disse que tava devolvendo o cheque que eles depositaram. O empresário me pegou em casa, acordamos Fernando Siqueira, titular deste caderno, na época gerente de Santos & Cia Ltda, distribuidor autorizado Ford em Natal, que tinha vendido o carro aos “empresários” e fomos ao prédio onde ficava o apartamento, que era no último andar, mas o barulho da festa dava pra se ouvir na rua. Como se tratava de “importadores” fomos à Policia Federal e o policial de plantão – depois de ouvir sobre a conta no banco e o checão depositado – profetizou que no dia seguinte eles tentariam um golpe. Armamos um esquema e quando eles chegaram ao banco para pedir a liberação de parte do dinheiro, foram abordados por agentes da PF. No fim da tarde o Delegado me ligou pra dizer que a dupla já vinha aplicando golpes em outros Estados.

Liguei pra Pedro Câmara pedindo que mandasse abrir o pesado caixão. Tava cheio de tijolos…

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