Um dos bairros mais antigos e que deu origem ao comércio de rua em Natal, a Cidade Alta, resiste à ampliação do número de shoppings centers pela cidade. Em 10 anos, o número de comércios ativos no bairro cresceu 17,89% – saindo de 609 em 2008 para 718 no ano passado. O pico de negócios formais ativos, porém, ocorreu em 2015, com 740 unidades. Margeado pelo Rio Potengi e cercado de algumas das construções arquitetônicas mais antigas da capital, a Cidade Alta viveu seu apogeu entre as décadas de 1980 e início dos anos 2000, sucumbindo ao esquecimento do Poder Público durante. Desde 2018, a partir da união de empresários que exploram a região comercialmente, iniciou um processo de transformação que tem atraído nossos empreendimentos.
Cidade Alta é o bairro comercial mais tradicional da capital, com relevância histórica e cultural
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Cidade Alta conta com aproximadamente 2,2 mil domicílios nos quais se dividem pouco mais de 7 mil pessoas. Por dia, conforme levantamento da Prefeitura do Natal, algo em torno de 10 toneladas de lixo são produzidas no bairro. O rendimento médio dos moradores da localidade gira em torno de 2,86 salários mínimos, maior que a média da capital como um todo. Por sediar inúmeros prédios públicos e históricos, como o Museu Café Filho, a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação e a Santa Cruz da Bica, a Cidade Alta é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e é Zona Especial de Insteresse Histórico pelo Plano Diretor de Natal.
Rua João Pessoa
Presente na Cidade Alta há quase 30 anos, o empresário fundador da loja Avohai, Delcindo Mascena, relembra do apogeu do comércio de rua no centro, das dificuldades que levaram inúmeros lojistas à falência e da migração de inúmeros deles para os shoppings centers. “As maiores mudanças, em 30 anos, ocorreram com a chegada dos shoppins centers e os descaso dos órgãos públicos com o Centro de Natal”, destaca Mascena. Os shoppings, centros comerciais com ar condicionado, entretenimento, conforto e iluminação adequada atraíram, entre os anos 1990 e 2000, lojistas de todos os portes. Hoje, porém, um processo de redescoberta do comércio de rua está em curso. Os altos custos de manutenção de lojas em shoppings provocam esse ‘efeito-retorno’.
Ao longo de 2018 e início deste ano, segundo dados da Associação Viva o Centro formada por aproximadamente 300 moradores do bairro e empresários, pelo menos 30 novas lojas foram abertas nas diversas ruas que servem como corredores comerciais na Cidade Alta. Outros gigantes do varejo como Atacadão dos Eletros, Ricardo Eletro e Lojas Renner, por exemplo, encerraram suas atividades na Cidade Alta também no ano passado. “Os empresários, e isso ocorre há pelo menos um ano, estão dispostos a voltar para a Cidade Alta. A própria sociedade está voltando a consumir no centro, em decorrência das melhorias implementadas como limpeza e segurança”, destaca Delcindo Mascena.
Avenida Deodoro da Fonseca
Ele relembra, ainda, a importância histórica do comércio que cresceu no bairro. “O Edifício Barão do Rio Branco pode ser considerado o primeiro shopping de Natal. Nas Lojas Brasileiras, a Lobras, a primeira escada rolante da cidade se tornou ponto turístico. Tínhamos também os Cinemas Nordeste e Rio Grande, a Casa da Maça na Av. Deodoro, as Lojas Americanas com dois pavimentos na Av. Rio Branco. E todos os prédios históricos, igrejas e prédios públicos instalados na Cidade Alta. Mas, precisamos melhorar muita coisa. Estamos abandonados há pelo menos 30 anos em relação ao turismo nessa região”, destaca. Há, ainda, o antigo Hotel Ducal, na Rua João Pessoa, que hospedou nomes reconhecidos da cultura e lideranças políticas. Hoje, o prédio está desativado.
Casa Rio e Riachuelo
Lojas que se tornaram nacionalmente conhecidas, com mais de 300 unidades em todo o país como a Riachuelo, por exemplo, nasceram na Cidade Alta. A unidade número um da rede está na Rua João Pessoa e hoje ocupa um quarteirão inteiro. Há cerca de 70 anos, fundada pelo empresário Alcides Araújo, a Casa Rio foi uma das primeiras lojas a importar produtos de outras cidades brasileiras para atender, principalmente, os soldados americanos durante a década de 1940 em Natal. Renomeada para Rio Center no final da década de 1950, expandiu suas operações na Rua João Pessoa até abrir mais duas unidades no Natal Shopping e na Av. Prudente de Morais.
Avenida Rio Branco
O vai e vem dos ambulantes
De olho nos pontos mais movimentados da Cidade Alta, o ambulante Arnaldo Arlindo de Paula Filho, de 51 anos, encontrou no cruzamento da Av. Rio Branco com a Rua João Pessoa, o local ideal para a venda de água mineral, café, cigarros e títulos de capitalização. “Fiquei desempregado depois de trabalhar por 15 anos no Turismo. Há três anos, vim trabalhar como ambulante e é daqui que tiro meu sustento. Vim para a Cidade Alta porque tem gente circulando e tem dinheiro circulando”, afirma.
Avenida Rio Branco
Há duas décadas, a rotina da ambulante Eliane Xavier é praticamente a mesma. Ao debulhar o feijão verde, ela relembra os tempos áureos do comércio popular na capital. “Comecei na Av. Rio Branco, quase em frente ao Banco do Brasil. Sempre vendi produtos naturais, feijão, ervas. Mas muita coisa mudou. Depois dos shoppings e dos cartões de crédito, o movimento diminuiu. Mas a gente segue na luta”, declara.
Uma coisa, porém, não mudou para a aposentada Ozélia Dias: o hábito de ir ao centro da cidade. “É aqui que estão os melhores preços, os melhores produtos. Não gosto de shoppings. Gosto de comprar aqui, que tem tudo”.
Fonte: Tribuna do Norte
Imagem: Mapio