No início, Operação Fronteira aparenta ser mais um filme sobre um super time que se junta para para realizar um roubo impossível — o último antes da aposentadoria. O elenco cheio de celebridades como Ben Affleck, Oscar Isaac, Charlie Hunnam, Garrett Hedlund e Pedro Pascal reforça a ideia. Mas também há algo no ar que destoa de outros filmes do gênero: o ritmo é um pouco mais lento, a realidade é mais palpável, distante dos bon vivants ao estilo George Clooney em Onze Homens e Um Segredo (2001) ou da equipe descolada de S.W.A.T. (2003).
Quando, enfim, Operação Fronteira assume uma nova forma, a de um filme sobre ganância e que discute valores morais, a “última missão antes da aposentadoria” passa a ser um purgatório, e nós assistimos à cada personagem viver um tipo de inferno.
A direção de J.C Chandor é o destaque do filme, nada é deixado em cena por acaso: “Existem outras questões na história que não podem ofuscar o centro de tudo, você não quer colocar o carro na frente dos bois. […] Mas eu fiz esse filme do mesmo jeito que fiz todos os outros da minha carreira, deixando o público angustiado, criando tensão, fazendo todas essas coisas e vendo como tudo se desenrola, para depois fazer com que o público questione a própria vida”, conta Chandor, por telefone.
O diretor também assumiu o roteiro junto com Mark Boal (Guerra ao Terror, A Hora Mais Escura): “Mark Boal escreveu a primeira versão do roteiro, e era uma grande aventura no melhor estilo S.W.A.T, que tinha todos os elementos que formam o coração dessa história. E daquele ponto em diante, eu passei a trabalhar nele todos os dias, para melhorar aquelas cenas e trazer essas questões, de um jeito que fizesse sentido”, diz.
No filme, um grupo de ex-militares se reúne para assaltar um traficante poderoso que mora no meio da selva, em um lugar que faz fronteira com diferentes países na América do Sul. Charlie Hunnam interpreta o ex-combatente William Miller, que vive de dar palestras sobre os próprios traumas. O ator conta que aceitou o papel porque identificou alguns pontos em comum com o personagem:
“É um homem que está consciente de sua jornada. A maioria das pessoas não está consciente da própria vida ou vivencia algo individualista. […] Os dois grandes temas do filme são união e propósito. É sobre como definimos um significado para nossas vidas, e como esse significado é celebrado. E isso, para mim, é algo com que consigo me relacionar”
A Netflix tem apostado em filmes originais e tem tido sucesso de público (Bright e Bird Box, principalmente, filme que fez a empresa, pela primeira, divulgar oficialmente sobre audiência) e de crítica (Roma, por exemplo, levou três Oscars). Antes disso, Beasts of No Nation e Mudo já constavam no catálogo. Para Hunnam, trabalhar com a empresa tira uma “certa pressão sobre quanto o filme vai render na primeira semana”. Além disso, destaca a liberdade criativa da equipe:
A diferença fundamental é quão ousada a Netflix é e como isso afeta a equipe criativa e quem faz o filme. Eles realmente confiam nas pessoas que eles contratam para fazer o trabalho, simplesmente chamam a equipe e permitem que essas pessoas façam o filme delas. O que é muito raro. Quando falamos de produções de grande orçamento, o estúdio pode interferir muito no processo. […] E eu acredito que se deve deixar o cinema para quem faz os filmes.
Embora recheado de estereótipos sobre a América do Sul e um final que não corresponde ao que o filme se torna na segunda metade, Operação Fronteira é uma obra competente e com ótimos momentos, principalmente nas cenas que envolvem dinheiro: “Eu acho que você entendeu tudo”, disse Chandor, quando falamos sobre todas as metáforas (“nada sutis”, como ele mesmo define) sobre as prioridades de nossa sociedade. Além disso, são cenas bonitas, criativas e que têm consequências na trama, afinal, o longa é essencialmente sobre ganância.
Chandor consegue passar sua mensagem com clareza para o espectador, mas é Hunnam quem melhor define o espírito do longa com uma reflexão inesperada sobre a sociedade:
Para mim, não é mistério que o mundo está saindo do controle, virado de cabeça para baixo. O ambiente e a sociedade que construímos para nós ao longo dos anos… É uma sociedade muito difícil, sabe? Não temos um senso de comunidade. Nós temos uma longa história, que nos transformou em pessoas sem cuidado com as outras, com privação de sono, deprimidas, sem união, hostis, que vivem esse tipo de vida
Operação Fronteira já está disponível na Netflix. O elenco conta com Ben Affleck (Tom “Redfly” Davis), Oscar Isaac (Santiago “Pope” Garcia), Charlie Hunnam (William “Ironhead” Miller), Garrett Hedlund (Ben Miller), Pedro Pascal (Francisco “Catfish” Morales) e Adria Arjona (Yovanna). Direção de J.C. Chandor.
Fonte: Jovem Nerd