Entrevista exclusiva: João Gordo

Foto: reprodução/Vírgula

A primeira vez que ouvi falar em João Gordo e, consequentemente, no Ratos de Porão, foi em 1987 e eu não passava de um moleque começando a escutar as “podreiras”. A capa emblemática do LP “Descanse em Paz”, lançado no ano anterior, me chocou de tal maneira que atiçou a minha curiosidade “juvenil” e me fez procurar saber mais sobre aquela famigerada banda. Quando me deparei então com aquele vocalista gigante vociferando palavras de ordem, de modo quase ininteligível, eu soube que seria um fã de carteirinha irremediável (e já se vão 32 anos dessa constatação, sem cura!).

A trajetória de João Gordo, porém, é mais antiga e recheada de histórias que se misturam a do próprio rock nacional em todas as suas vertentes. E se a tríade “sexo, drogas & Rock n’ Roll” se fez presente, ele soube driblar todas as rotulações clichês que tentaram “grudar” em sua persona, se reinventando sempre que preciso e sobrevivendo para ser quem é hoje: pai e marido dedicado, músico internacionalmente respeitado, apresentador consagrado, empresário consciente, vegano aplicado e… um dedo médio sempre em riste para as hipocrisias sociais.

Aos 54 anos, João Francisco Benedan (seu nome verdadeiro) continua urrando alto nos vocais do Ratos de Porão, que está prestes a sair em turnê internacional pelo Chile. Mas antes disso ele arranjou um tempinho para conversar com o JOL/RN. Com a palavra, João Gordo:

“Baratas nas paredes, aranhas pelo chão, cobras na sua cama e ratos no porão…” (Música: ‘Beber até Morrer’) – Foto: Imagens.Us

A poucos anos você abriu sua vida para o grande público através de uma biografia extremamente sincera e honesta. Quando eu terminei de ler, confesso que estava mexido por dentro, um misto de sentimentos e de cara me veio a pergunta: “caralho, como ele se sentiu depois de passar isso tudo a limpo nessas páginas?”. E então, como se sentiu?

Realmente algumas coisas, como relembrar as brigas com meu pai, mexeram bastante comigo e cheguei a ficar meio depressivo por alguns dias. Mas há passagens muito hilárias e condensar uma vida inteira em poucas páginas não é nada fácil. No final das contas me senti feliz por não mentir muito e nem esconder muita coisa (risos).

Biografia de João Gordo, intitulada “Viva la vida tosca”, lançada pela editora Darkside. – Foto: RDPeido

O Século Sinistro parecia até que estava prenunciando todo o caos político e social em que o Brasil iria mergulhar logo após o lançamento, em 2014. Você acha que ele continua atual?

É um prenuncio do apocalipse de merda que estamos vivendo! Mas o disco “Brasil”, de 1989, é muito mais assustador, com músicas como: “Amazônia Nunca Mais”, “Retrocesso”, “S.O.S país falido” e “Farsa Nacionalista” … são tão atuais que parecem que foram escritas ontem (e já tem 30 anos…).

LP “Brasil” de 1989: letras atuais mesmo após 30 anos. – Foto: Acervo/Ratos de Porão

Fevereiro será um mês bem cheio para o Ratos, inclusive com uma turnê por 05 cidades do Chile. Aos 54 anos, casado, pai, empresário e apresentador, como é sair em turnê com a banda?

Tranquilo, não fazemos mais que duas semanas de tour e os “pés na jaca” estão “quase” aposentados (risos).

Ratos de Porão. Da esquerda para a direita: Juninho, Jão, João Gordo e Boka. – Foto: Acervo/Ratos de Porão

Lembro que nos anos 80 eram comuns as tretas entre headbangers e o pessoal que curtia hardcore, grind e afins (que não eram apenas os punks, como muitos simplificam), mas você sempre transitou entre os dois mundos com fluidez e, ouso dizer, praticamente inventou o crossover no Brasil. Olhando para trás, como você enxergava isso e como vê o atual cenário, bem mais pacificado?

A internet meio que unificou e padronizou o público de som pesado no mundo todo, não há mais diferenças brutais como antes.

O que você escuta quando está com a Victoria e com o Pietro?

A Victoria escuta Rap, Ragga, MPB e o Pietro gosta de Classic Rock.

Assistindo a sua entrevista para o canal O Ben Para Todo Mal vi ali um verdadeiro pai, que dosa disciplina e amor de maneira surpreendente. A maioria das pessoas, porém, não conhece esse seu lado, ficando apenas com o estereótipo vendido pela mídia em nome de atrair audiência. Como você lida com isso?

Não me lembro dessa entrevista… estou cagando pra povo idiota que me conhece só da TV e desconhece meu verdadeiro trampo como músico.

Da esquerda para a direita: Viviana Torrico (esposa), Pietro, Victoria e João Gordo. – Foto: UOL

O que você tem ouvido atualmente? Indicaria algum som “imperdível” para os leitores?

Escuto muito coisa antiga, anos 60 e 50 é um campo imenso e inexplorado.

O Ratos de Porão tem a intensão de lançar algum novo trabalho autoral? Acho que o atual cenário do país renderia um LP “Brasil 2”, com capa do Marcatti e tudo…

Demoramos muito pra gravar… o ultimo disco demorou 8 anos.

Lançado em 2014, foi eleito o eleito o sétimo melhor disco nacional de 2014 pela Rolling Stone Brasil. – Foto: Acervo/Ratos de Porão

Você já teve a oportunidade de estar no palco e tocar com muitos de seus ídolos. Existe algum com quem você ainda não tocou, mas que gostaria?

Waldick Soriano (risos).

 

Waldick Soriano: uma parceria, no mínimo, inusitada. Foto: Facebook
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