Crônica: um naco da minha experiência com os videogames

Nasci no ano de 1982, em Natal, capital do Rio Grande do Norte. Numa modesta cidade de uma das regiões mais depauperadas do país, o acesso à tecnologia de ponta, na década de 1980, era por demais difícil e restrito. Além do mais, no Brasil de então, vivíamos sob a vigência da Lei de Reserva de Mercado, que afugentava as empresas multinacionais do setor de informática do território nacional, o que, obviamente, incluía os jogos eletrônicos. Destarte, o primeiro console doméstico que tive – um Atari 2600 fabricado pela Polyvox, empresa nacional subsidiária da Gradiente – já estava ultrapassado havia um longo tempo; porém, pela escassez de concorrência, ainda fazia muito sucesso entre os brasileiros.

Fui agraciado com esse presente quando tinha apenas cinco anos. Não obstante a tenra idade, ainda tenho vívidas memórias desse período de minha vida: a munheca dorida e os controles estragados, praticamente imprestáveis, por jogar o temido Decathlon; as madrugadas em claro, à surdina, vidrado em Enduro, estupendo jogo de corrida com alguma perspectiva geométrica; a animação incontida de comer as pílulas piscantes e devorar os inconvenientes fantasminhas de Pac-Man; a curiosidade de explorar o cenário selvático e apinhado de obstáculos de Pitfall!; os ataques de fúria – odiava perder! –, que resultavam em joysticks arremessados na parede e em altissonantes xingamentos – nem mesmo Deus escapava! Todas essas reminiscências guardo com carinho e afeto. Afinal de contas, elas me ajudam a trazer à baila um pouco da minha já distante infância.

No começo da década de 1990, chegou a vez de substituir o vetusto Atari 2600 pelo também já obsoleto Turbo Game, fabricado pela brasileira CCE, que se tratava de um genérico ou clone – na realidade, uma cópia descarada e acobertada pela supramencionada Lei de Reserva de Mercado – do Nintendo, console de 8 bits da terceira geração. O videogame da CCE tinha dois slots, de 60 e 72 pinos, uma facilidade a mais para o consumidor, pois se usavam tanto cartuchos japoneses como americanos. Foi a primeira vez que, empolgadíssimo e quase sem me conter de tamanha emoção, utilizei a pistola de luz num jogo caseiro, a divertida caça aos patos de Duck Hunt. A única coisa que me tirava do sério nesse jogo era aquele maldito cachorro que gargalhava às minhas custas quando eu errava o alvo! Minha vontade era entrar na TV e esfolá-lo vivo (risos)!

Conheci diversos jogos do Nintendo graças à “pirataria legalizada” da CCE. Infelizmente, não há espaço para elencar todos aqui – seria necessário um artigo só para isso. Destaco, no entanto, a trilogia Super Mario Bros., sobretudo o terceiro, o qual me levou para oito mundos repletos de fantasia, magia e, acima de tudo, verve e diversão. Consumi boa parte das madrugadas dos meus dez anos a tentar zerá-lo, proeza que, depois de muitas semanas e palavrões proferidos mentalmente – não podia bradar por causa do horário! –, realizei. Para mim, Super Mario Bros. 3 continua sendo um dos melhores jogos eletrônicos de todos os tempos. Obrigado por essa obra-prima, Shigeru Miaymoto!

Mais ou menos nessa mesma época, deparei-me com o Master System, console da Sega com gráficos mais bonitos que vinha sendo fabricado no Brasil desde o final da década de 1980 pela competente Tec Toy. Não tive tanta intimidade com ele, dado que pertencia a um primo com o qual me encontrava apenas ocasionalmente, pelo fato de o dito-cujo morar em outra cidade. Mesmo assim, dois de seus jogos me marcaram: Alex Kidd, a divertida estreia do personagem simpático e orelhudo, uma das primeiras mascotes da Sega, e Double Dragon, um beat’em up entusiasmante e, melhor ainda, muito fácil de ser zerado (não vou negar: prefiro os jogos fáceis aos difíceis; sou um jogador de meia-pataca).

Em 1995, entrei de cabeça na quarta geração dos videogames: adquiri o sonho de consumo de dez entre dez moleques brasileiros à época: o Super Nintendo, carro-chefe dos 16 bits. Lembro-me até do agradável odor que a caixa e o console, novinhos em folha, exalavam. Foi uma festa poder jogar Super Mario World em casa, sem aquele magote de guris atrevidos e xeretas das games que costumava frequentar. O enlevo aumentou na medida em que fui comprando e alugando novos jogos: Top Gear, exímio jogo de corrida com trilha sonora antológica; Golf Troop, aventura com toques de RPG e Puzzle; Mega Man X, jogo de ação extremamente difícil, porém divertidíssimo; International Superstar Soccer, futebol de primeira linha, no qual fazíamos gols por meio de macetes sem-vergonha.

Também obtive, nesse mesmo período, o Mega Drive, desenvolvido pela Sega, console rival do Super Nintendo, ao qual era inferior em quase todos os aspectos técnicos, com exceção do processador. Porém, o videogame da Sega tinha uma biblioteca de jogos que não deixava nem um pouco a desejar em comparação à de seu concorrente. Sinceramente, não posso deixar de admitir, aquele é meu console predileto (abaixo apenas do todo-poderoso ColecoVision, sobre o qual discorrerei assim que tiver oportunidade). Jogos como Sonic – The Hedgehog, tanto o primeiro como o segundo – e, em menor medida, o terceiro –, Altered Beast, X-Men, Lakers vs. Celtics and the NBA Playoffs, Kid Chameleon, Fighting Masters e a série Streets of Rage simplesmente piraram meu cabeção. Ah, quanta nostalgia no coração!

Todavia, não tive uma boa experiência com o Sega CD e o 32X, acessórios do Mega Drive então bastante populares: o primeiro, na maioria das vezes, não dispunha de jogos palatáveis, sem falar que eram difíceis de se encontrar na minha cidade (na década de 1990, Natal ainda era provinciana); o segundo, por sua vez, não passava de uma tapeação (mancada tamanho-família da Sega, que o lançou ao mesmo tempo que o Sega Saturn, console da quinta geração), e o meu nunca funcionou direito, pois veio com um defeito de fábrica – tremenda falta de sorte, hem?! Creio que ambas as decepções explicam, em grande medida, meu desligamento do mundo dos videogames, que duraria, para ser preciso, até o ano de 2006, quando dei início à minha coleção, a qual conta, atualmente, com cerca de 60 consoles e integra o acervo do Museu do Videogame Potiguar. Porém, isso é assunto para outro artigo.

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